sexta-feira, 14 de setembro de 2012

CONTAR OS PREJUÍZOS



O mal está feito e os danos não são colaterais, são mesmo centrais. As intervenções de Passos Coelho e de Vítor Gaspar encarregaram-se de quebrar amarrações com vários segmentos da sociedade portuguesa. Cabe-lhes agora quantificar os prejuízos, como fazem diligentemente as populações depois de um tornado ou de uma simples partida dos elementos naturais.
Hoje, vários membros do Governo (Defesa, Justiça, Administração Interna, Economia) que tão escondidos andavam e aos quais não se via uma ideia que fosse, afinal por não terem nada que apresentar, emergiram como papagaios, mas tardiamente, mais às turras com o PS do que em defesa firme e esclarecida do Governo. Muito dificilmente alguém os levará a sério. Na opinião pública e sobretudo na comunicação social a ideia central é a dos ratinhos e ratões a abandonar o barco. O efémero da governação deve estar a deixar destroçada uma boa parte dos que ocuparam cargos de poder, diretamente a partir das concelhias e distritais.
Entre os vários prejuízos a quantificar, há um que vale a pena destacar, pois mandar às malvas os resultados da concertação social em torno da legislação laboral não lembraria ao diabo feito gente. Mas lembrou. Lá bem no meio de uma das mais infelizes participações de António Lobo Xavier no Quadratura do Círculo de ontem, ficou bem claro que mandar às malvas a concertação social é talvez o exemplo mais gritante de incompetência de gestão do tempo político. E o argumento de Passos Coelho de que governar não é fazer a vontade à opinião pública soa a falso, pois o problema não é esse, o problema é a incompetência política de quebrar amarras com a sociedade em temas tão sólidos como o da concertação social. Não consegui ainda descortinar alguém que se tenha identificado com a redistribuição direta e sem anestesia de rendimento a partir da manipulação da taxa social única. Bagão Félix (quem diria!) tocou no ponto certo: quebrou-se o vínculo social da relação nobre e inquestionável entre uma contribuição e um benefício, transformando a taxa social única num imposto, tudo isto à revelia e com profundo desrespeito pela concertação social.
O estilo de liderança política comum ao protótipo Passos Coelho, que poderemos caracterizar como a chegada ao poder da geração dos Jotas, ilustra bem o tipo de sensibilidades que estão a ser formadas nessas máquinas, posteriormente enobrecidas por licenciaturas obtidas sabe-se lá em que condições. O discurso parece formalmente agarrar os temas. Mas lá no fundo, o que temos são colagens, máquinas falantes, de discurso fácil, com uma incompleta insensibilidade ao que é uma negociação política, à compreensão do sentir mais profundo da população. Sabemos que José Pacheco Pereira tem esta gente como inimiga de estimação. Mas a sua caracterização da impreparação e incoerência desta geração é uma obra-prima de perspicácia, realismo e contundência.
Nos próximos dias, a contagem dos prejuízos vai continuar. Mas haverá alguém disposto a pagar o custo da reconstrução? Senadores tão propensos à condescendência com este Governo, como António Barreto, apelam pateticamente à reconstrução a todo o preço. Será a impreparação de que falávamos tão gritante a ponto de tudo isto ser uma surpresa para os seus mentores? O cruzamento de uma cultura jota (Passos Coelho) com a frieza da socialização pelos centros de estudos do BCE, onde se vive entre parâmetros de modelos mais ou menos sofisticados (Vítor Gaspar), está a produzir uma verdadeira aberração política, que está a desabar.

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