quarta-feira, 19 de setembro de 2012

DEUS, CRIAÇÃO E ÁLVARO


Pessoa amiga, que também as tenho, fez-me chegar às mãos um romance extraordinário e que, apesar de já vir datado de 2007, me era completamente desconhecido.

Inescapável deixar aqui um pequeno e ilustrativo trecho dessa verdadeira obra-mestra:
“Após esses milhões de anos Deus levantou-Se e decidiu novamente fazer algo que O animasse, porque se não o fizesse viver eternamente tornar-se-ia num verdadeiro inferno, numa autêntica tortura, mesmo para um Deus como Eu, e foi assim que Se perguntou novamente o que fazer?, o que fazer?, o quê?, o quê?, até que um dia Se lembrou de uma solução, e se Eu criasse um outro Deus?, outro Todo-Poderoso?, um ser semelhante a Mim, é pá, boa ideia!, assim poderemos ter conversas intermináveis durante biliões, biliões e biliões de anos, ou então falaremos sobre o sentido da vida, o que é que significa ser Deus, o que é que um Deus deve fazer?, como é que um Deus deve comportar-Se, como é que deve reagir a circunstâncias adversas, como ser um Deus de um espaço vazio infinito, governante supremo de todo o nada visível e invisível?, ou..., ou então poderemos fazer planos para os próximos biliões de anos, decidindo criar mais estrelas ou outra coisa qualquer que não Me vem agora à cabeça [Deus tem cabeça???], ou então poderemos contar anedotas Um ao Outro, já conheces esta daquele fulano?, já imaginaste aquela do sicrano, ou então poderemos ver quem é mais poderoso, quem é mais imponente, mais dominador, se Eu-o-Criador-Dele ou Ele-a-Minha-criação..., hum..., hum..., pensando bem..., não!, não!, é melhor não..., é melhor não criar outro Deus..., é melhor não!, pois... e se Outro se fartar das Minhas falinhas mansas e Se virar contra Mim?, apanha-Me de costas ou distraído e pumba!, já está!, dá cano de Mim!, pum!, finito!, caput!, acabou-se a papa doce!, e depois não há mais conversa, não há mais aborrecimento, não há esta espera, não há este poder que tenho, esta magnânime omnipresença e omnipotência..., não!, não posso criar um Ser tão poderoso como Eu!, não posso criar um outro Deus, um outro imortal!, tem que ser algo inferior, algo menos poderoso, algo que Eu possa controlar!, algo que pereça antes que se torne poderoso, algo que Eu possa destruir se algum dia me ameaçar..., hum..., hum..., mas o quê?, o quê?, o quê???, e, não encontrando resposta para esta questão, Deus sentou-Se no meio do espaço vazio infinito a pensar, a pensar, a pensar, e foi somente depois de muitos, muitos, muitos, muitos, mas mesmo muito anos, que Deus exclamou já sei!, vou criar um Universo!!!, um universo com matéria visível e invisível, com estrelas e planetas e galáxias e buracos negros e supernovas e luas e cometas e asteróides e nuvens inter-galácticas e nébulas e e e e e e e e e e e e, bem como tudo o que mais deve existir num universo-que-nunca-mais-foi-criado-antes-porque-Eu-nunca-Me-tinha-lembrado-disso!!!E assim seria. Deus criaria um universo. E Deus viu que isto seria bom.”


Dito isto, o dado verdadeiramente notável tem a ver com a identidade do autor, um rapaz viseense que se licenciou e doutorou em Economia e era professor no Canadá, Álvaro de seu nome. Ao tempo do lançamento deste romance de estreia, uma peça da RTP (1 de maio de 2007) mostrava-o, bem mais viçoso mas já orgulhoso de si próprio, explicando convictamente:
“A eternidade é demasiado longa, não é? Se nós pensarmos que o universo tem cerca de 14 biliões de anos (…), se pensarmos que Deus existiu desde sempre não é? – existe desde toda a eternidade –, 14 biliões de anos na eternidade não é nada, é um segundo.
Se nós pensamos Deus como agente, como criador, então o que é que Deus fez antes da eternidade, o que fez antes do big bang, o que é que Deus fez antes da criação?"
Ou ainda: "Os últimos 200 anos trouxeram-nos avanços tecnológicos e científicos de uma maneira impressionante (…). Se nós conseguimos tanto em 200 anos, imaginemos – se conseguirmos sobreviver, se não nos aniquilarmos a nós próprios – o que é que acontecerá dentro de mil anos, dois mil anos, um milhão de anos, um bilião de anos? É uma imensidão.
Vir, dois mil anos depois ou três mil anos depois, dizer que tudo o que foi escrito pela Bíblia é a palavra de Deus, nem o próprio Papa acredita…”
 
Agora que a remodelação governamental parece estar para breve, assim pondo provavelmente cobro à hercúlea missão que Álvaro tão patrioticamente abraçou de reformador e salvador do País, é tempo de lhe implorar que reincida. Que bonito seria se em 2013, quando Portugal voltar a crescer em resultado da sua rara visão económico-política, já pudéssemos ter nos escaparates mais uma portentosa criação literária desta criatura abençoada por Deus!

Sem comentários:

Enviar um comentário