Numa conversa acalorada com o meu filho Hugo na sequência
da comunicação-fava de Vítor Gaspar da tarde de ontem, carpindo algum veneno
pela violência das medidas anunciadas e sobretudo pelo desplante de as
considerar uma solução, sugeriu-me uma dica aparecida no The Economist de há menos de um mês. Não tinha sido então
indiferente a essa referência, mas a minha indisciplina de leitura e,
certamente na altura, a falta do caderninho que serve de registo inspirador
para muitos dos posts terá colocado
no esquecimento esta ideia.
Do que é que se trata e em que medida se ajusta cada vez mais à situação portuguesa?
Luigi Zingales, fotografia acima, é professor na Booth
School of Business da Universidade de Chicago em entrepreneurship e finanças, afinal estamos no coração ou no
epicentro do mainstream economics que
irradiou a partir daí para todo o mundo, ainda hoje reduto dos irredutíveis,
ainda que com algumas brechas, Richard Posner, por exemplo.
Zingales traz para a análise do que tem vindo a chamar-se
capitalismo de compadrio (crony capitalism) propostas muito
interessantes. O que não deixa de ser uma constatação muito relevante. Sim! O
capitalismo de compadrio não é um exclusivo de Krugman e companhia. No reduto
dos irredutíveis há quem pense com imaginação sobre o assunto. Estou curioso
por ler na próxima paragem a sua última obra: “A Capitalism for the People:
Recapturing the Lost Genius of American Prosperity” (Um
capitalismo para as pessoas: recapturando o génio da prosperidade americana).
Zingales distingue habilmente entre governos “pro-market”
e “pro-business”.
O que os distingue? Os primeiros procuram governar no sentido de criar efetivas
condições de liberdade de concorrência nos mercados e podem mesmo chegar ao
ponto de criticar o universo dos negócios quando, por via do que temos vindo a
designar neste blogue de captura do Estado, fazem o possível e o impossível
para viciar o jogo desse mercado. Os mais conservadores podem ser defensores
envergonhados do “pro-market”,
receando investir contra os captores por supostamente tal crítica ou denúncia
poder ser entendida como desvio face ao mercado. Quanto aos segundos não há que
enganar! São governos que governam para interesses concretos. A defesa do
mercado é uma máscara. Vivem da proteção aos que capturam o Estado e não
hesitam em atingir outros interesses para defender os seus patrocinadores,
amigos, pretensos mecenas.
Segue-se um mero exercício de aplicação.
Questão prática: o governo atual, tão pomposamente autodesignado
de liberal, praticará uma governação “pro-market” ou “pro-business”?
Parece não ser necessário ter uma grande cabeça para
compreender que estamos claramente perante um governo “pro-business”, que
governa para grupos de interesses de estimação, sobre os quais faz algumas cócegas
de apelo à participação na via da austeridade. Aliás, é muito curioso seguir
com atenção e acompanhar à lupa tomadas de posição públicas de grandes empresários
portugueses e diferenciá-las consoante os alocamos ao universo do “pro-business”
ou do “pro-market”.
Ontem, Belmiro de Azevedo, na sua simplicidade que chega por vezes a roçar o
simplismo das ideias, dizia no meio do turbilhão de reações mais ou menos isto:
agradeço a poupança que a redução da taxa social única vai proporcionar, mas
tenho a certeza que vamos perder, não sei quanto, nas vendas por força do
confisco do consumo que a austeridade adicional irá determinar. Dispenso-me,
caro leitor, de indicar alguns testemunhos em contraponto: salamaleques, blá-blá,
as medidas são duras mas necessárias, arrepiar caminho, etc, etc. Seguramente
que na grande maioria desses testemunhos iremos encontrar beneficiários da
governação “pro-business”. Pudera!
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