Nas pequenas abertas de um dia de trabalho em Vigo, que
deu para reciclar a minha informação sobre os cenários eleitorais para as
regionais com o governo central a namoriscar uma espécie de resgate que não é
desejado como tal (um resgate light), acompanhei de perto o que me parece ser a
melhor cobertura on line da decisão
de hoje do BCE - o LIVEBLOG do Financial Times sobre a matéria.
Visual e esteticamente, a sessão ganharia com a
centralidade exclusiva da presença de Draghi, pois a cadeira do lado, ocupada
pela nossa múmia paralítica do Vítor Constâncio, recauchutada com o restaurador
OLEX para um “Brown hair” que lhe fica a matar, é um bocado deprimente.
Mas, passando além deste pormenor, a decisão de hoje
consagra mais uma etapa da corrida de longo curso, espera-se, que Draghi se propôs
iniciar a partir do momento em que se decidiu pela via mais heterodoxa para levar
a bom rumo o seu mandato estatutário. Como tenho aqui referido, Draghi tirou
uma espécie de coelho da cartola, de circunstância, que pode resumir-se mais ou
menos nesta ideia: quando os mecanismos de transmissão da política monetária
destinada a estabilizar o nível de preços estão em risco, há que procurar,
mesmo que por via heterodoxa, restabelecer esses mecanismos. O argumento parece
que convenceu os seus parceiros, com exceção da recusa anunciada do Bundesbank
e, pelos resultados imediatos, parece que também os mercados de títulos de dívida
soberana e os mercados bolsistas alinharam com esse convencimento.
Estes homens de fato escuro têm uma imaginação prodigiosa
(pudera, treinaram bem no âmago da sofisticação financeira de má memória recente)
e uma sigla mais para uma história futura da indeterminação sobre a zona euro emergiu: OTR
(Outright Monetary Transactions) que se seguem por isso às LTRO de Dezembro
2011 e Fevereiro 2012, reinventando o glossário das intervenções da política
monetária.
O BCE propõe-se intervir no mercado secundário dos títulos
soberanos, comprando, sem limite de montantes, títulos de países de países em
dificuldade que, estando no mercado e não fora dele como Portugal, solicitem ao
Fundo de Estabilidade Financeira a intervenção sob um regime de apertada
condicionalidade, leia-se controlo com participação do FMI nesse processo. A
intervenção é realizada em regime de absoluta paridade com os outros
investidores, não assegurando ao BCE qualquer regime preferencial face aos
restantes credores privados.
Claramente uma intervenção de bom senso, apesar da oposição
alemã, mas simplesmente mais uma etapa na corrida sinuosa que Draghi escolheu
para o longo curso.
A posição oficial que o Bundesbank se apressou a fazer
circular, marcando a sua posição isolada na decisão, vale a pena ser lida. Não
porque tenha algo de novo. O Bundesbank continua a expor a sua tese de que
operações desta natureza equivalem a financiar os governos. Frisa, entretanto,
que a exposição do banco central a estas operações pode a longo prazo implicar
riscos para os contribuintes, só aceitável se corresponder a uma decisão democraticamente
autorizada por governos e parlamentos eleitos. A posição do Bundesbank é passível
de ser desmontada, mas a referência aos parlamentos e governos eleitos é bem
apanhada e deveria merecer às autoridades europeias uma outra atenção.
Hoje, houve quem questionasse se a decisão de Draghi não
significaria o fim de um ciclo de política monetária dominada pelas posições
alemãs. Só a história o poderá confirmar. Para já, o que temos são duas
abordagens diferentes a uma corrida de longo curso. A abordagem mais heterodoxa
só poderia partir de um homem do sul, apesar de toda a sua aprendizagem no
Norte.
E agora a bola está do lado do governo espanhol e
italiano. O primeiro bem pode invocar a ideia de um resgate light. Os próximos tempos dirão se será
tão light como isso. Por cá
continuaremos expectantes. As OTR só se aplicam a economias que estejam no
mercado. Não seria tão taxativo como Seguro o foi proclamando que a medida
encurtaria o tempo de regresso de Portugal aos mercados. Gostaria de perceber
melhor a confiança manifestada.
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