(O estudo da
distribuição do rendimento a nível mundial, isto é, analisada como se todos os
indivíduos pertencessem a um único país, traz novas implicações e perspetivas
para temas que os economistas se habituaram a não questionar. Branko Milanovic, um dos primeiros a
estudar aprofundadamente esta perspetiva da desigualdade, mostra que há temas
que devem ser revisitados…)
Ainda no post de ontem, invoquei
parcialmente este tema, quando mostrei que há hoje uma fratura entre os beneficiários
da melhoria da desigualdade a nível mundial (os que saem da pobreza absoluta nos
menos desenvolvidos e as classes médias das economias emergentes) e os que
sofrem com a sua deterioração nas economias maduras e avançadas. O tema é
relevante pois sabemos que não existe nenhuma forma de governo mundial que
possa dirimir esse conflito.
Mas a partir do momento em que pensamos a desigualdade a nível mundial, Milanovic
mostra que há velhas questões da economia que merecem ser revisitadas. No seu último texto no seu blogue Globalinequality, Milanovic afronta provocatoriamente o
tema da convergência entre países, que nos habituamos, talvez mais por inércia
do que por qualquer outro motivo. A teoria da convergência sustenta que, tendo
em conta as diferenças estruturais entre os países que explicam o máximo de produtividade
a que os países podem aspirar, os países mais pobres tenderão a crescer a taxas
mais elevadas, tendendo assim a convergir. Não vos vou maçar como é que termos
práticos se apaga o efeito dos EUA poderem aspirar a um nível de produtividade
que não tem qualquer comparação com o de uma economia africana. O que me
interessa realçar é que se raciocina entre países, associando-os a um
rendimento médio e é em função deste rendimento médio que se discute a convergência
(ou a divergência).
Ora, essa forma de pensar oculta uma importante limitação. Na verdade, os
habitantes do país pobre, designadamente os mais qualificados, podem não
acreditar na teoria da convergência e explorar a liberdade de circulação,
procurando em países mais ricos uma vida melhor. Se não houver um qualquer Trump
ou outro marado qualquer que se oponha a tal liberdade de circulação, o deslocamento
de pessoas qualificadas dos países pobres para os mais ricos afeta significativamente
as hipóteses de convergência. Um efeito seguro, é o empobrecimento do país
pobre, não sendo tão fácil identificar o que acontece à desigualdade no país de
origem e no país de chegada. Mas que do ponto de vista mundial a desigualdade
descerá disso não haverá dúvidas.
Um tema aparentemente inquestionável fica baralhado.
MIlanovic estende a provocação ao ponto de mostrar que o direito à
liberdade de circulação poderia acabar com alguns países. Tenho sempre receio
de invocar este tipo de sondagens, mas Milanovic cita resultados de sondagens
GALLUP que mostram que alguns países poderiam perder cerca de 90% da sua
população se a imigração não enfrentasse os obstáculos que hoje enfrenta.
O que suscita problemas filosóficos de grande transcendência.
Um deles é quase um corolário do princípio da liberdade de circulação em
busca de uma vida melhor. Será que para preservar a existência de certos países
teremos de condenar para sempre à pobreza uma grande maioria dos seus pobres
residentes?
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