sábado, 31 de dezembro de 2016

2016

(Helen Mirren: "... 2016 foi um grande monte de merda"



Não sei se escolha o “grande monte de merda que foi 2016” de Helen Mirren ou o “Fuck 2016” de Clara Ferreira Alves para caracterizar a turbulência, as derrotas, as derivas, os desaparecimentos, os desencantos, os fanatismos deste ano que acaba e que não é para velhos, mas também não inspirou confiança aos mais novos. Não me consola que, embora com perigos e incertezas à porta, Portugal seja um relativo oásis e que o turismo sancione essa aparente ilha de segurança. È verdade que a solução política que avançou em Portugal este ano nos deu alguma esperança, destruindo tabus e impossibilidades, mostrando entre outras coisas que a direita terá de dar bastante à perna para conseguir uma maioria absoluta. As soluções políticas estão menos cristalizadas e ficarão ainda mais abertas se o PSD assumir o seu papel e regressar a algo mais parecido com a social-democracia, ou seja mais ou centro, e abandonar esta deriva de jotinhas impreparados, sedentos de destruição do que eles consideram o arcaísmo do país. É verdade também que Marcelo nos reconciliou com a Presidência da República, apagando na nossa memória o desconforto cinzento de Cavaco.

Mas Portugal é demasiado pequeno para que o contraciclo que aqui vivemos seja suficientemente esperançoso para apagar as agruras do que nos envolve no exterior, da desagregação da Europa à irracionalidade americana, passando pela destruição da Síria, o rastilho da Turquia, a permanência dos problemas do Médio-Oriente, o avanço da Rússia oligárquica.


(Entrevista de Marie-Héléne Caillol - diretora do think-tank LEAP sobre a desagregação europeia)

A desagregação europeia com os ventos do BREXIT a ampliar sintomas que eram identificáveis já há algum tempo (veja-se a excelente entrevista de Marie-HélèneCaillol diretora do LEAP ao La Vanguardia) é uma nuvem negra a toldar o nosso futuro e uma pequena economia como a nossa será sempre penalizada num contexto de comércio internacional musculado pelas tentações do intervencionismo à Trump ou de qualquer outro alucinado. Compreendo que um plano de contingência para uma eventual saída do euro, que pode precipitar-se com os acontecimentos políticos de 2017 em França e em Itália, será necessário. Mas continuo a não estar convencido que uma saída deliberada do euro seja vantajosa para a economia portuguesa, pois não sou admirador de desvalorizações competitivas para uma economia com a nossa dimensão.

Quer isto dizer que 2016 marcou bem fundo o horizonte externo penalizador em que nos movemos apesar do contraciclo que a história política recente nos proporcionou.

Este blogue teve oportunidade de sublinhar alguns desses temas que não podem estar fora da cogitação do nosso futuro, com ou sem geringonça: (i) o recuo da globalização e ausência de um discurso para a mesma que não se renda às meta-empresas globais; (ii) o efeito do progresso técnico (automação, robotização, …) na destruição de empregos na indústria transformadora mais do que os efeitos da globalização; (iii) a emergência dos populismos; (iv) a contradição entre a melhoria da desigualdade a nível mundial e o agravamento da mesma nas economias maduras e avançadas; (v) a falta de rumo da política monetária e o regresso necessário à política fiscal; (vi) a absoluta carência de uma nova ordem intelectual para orientar a coordenação na economia mundial; (vii) a tentação do operariado nas economias avançadas para ceder à sedução dos populismos à direita; e tantos outros.

Mas apesar de todas as nuvens, negras ou simplesmente cinzentas, Feliz 2017 para todos os que nos honram com a leitura regular ou esporádica deste blogue. Que a energia não nos falte para responder positivamente a esse interesse no INTERESSE.

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