(Helen Mirren: "... 2016 foi um grande monte de merda"
Não sei se
escolha o “grande monte de merda que foi
2016” de Helen Mirren ou o “Fuck 2016”
de Clara Ferreira Alves para caracterizar a turbulência, as derrotas, as
derivas, os desaparecimentos, os desencantos, os fanatismos deste ano que acaba
e que não é para velhos, mas também não inspirou confiança aos mais novos. Não
me consola que, embora com perigos e incertezas à porta, Portugal seja um
relativo oásis e que o turismo sancione essa aparente ilha de segurança. È
verdade que a solução política que avançou em Portugal este ano nos deu alguma
esperança, destruindo tabus e impossibilidades, mostrando entre outras coisas
que a direita terá de dar bastante à perna para conseguir uma maioria absoluta.
As soluções políticas estão menos cristalizadas e ficarão ainda mais abertas se
o PSD assumir o seu papel e regressar a algo mais parecido com a
social-democracia, ou seja mais ou centro, e abandonar esta deriva de jotinhas
impreparados, sedentos de destruição do que eles consideram o arcaísmo do país.
É verdade também que Marcelo nos reconciliou com a Presidência da República,
apagando na nossa memória o desconforto cinzento de Cavaco.
Mas Portugal
é demasiado pequeno para que o contraciclo que aqui vivemos seja
suficientemente esperançoso para apagar as agruras do que nos envolve no
exterior, da desagregação da Europa à irracionalidade americana, passando pela
destruição da Síria, o rastilho da Turquia, a permanência dos problemas do
Médio-Oriente, o avanço da Rússia oligárquica.
(Entrevista de Marie-Héléne Caillol - diretora do think-tank LEAP sobre a desagregação europeia)
A
desagregação europeia com os ventos do BREXIT a ampliar sintomas que eram
identificáveis já há algum tempo (veja-se a excelente entrevista de Marie-HélèneCaillol diretora do LEAP ao La Vanguardia) é uma nuvem negra a toldar o nosso
futuro e uma pequena economia como a nossa será sempre penalizada num contexto
de comércio internacional musculado pelas tentações do intervencionismo à Trump
ou de qualquer outro alucinado. Compreendo que um plano de contingência para
uma eventual saída do euro, que pode precipitar-se com os acontecimentos políticos
de 2017 em França e em Itália, será necessário. Mas continuo a não estar
convencido que uma saída deliberada do euro seja vantajosa para a economia
portuguesa, pois não sou admirador de desvalorizações competitivas para uma
economia com a nossa dimensão.
Quer isto
dizer que 2016 marcou bem fundo o horizonte externo penalizador em que nos movemos
apesar do contraciclo que a história política recente nos proporcionou.
Este blogue
teve oportunidade de sublinhar alguns desses temas que não podem estar fora da
cogitação do nosso futuro, com ou sem geringonça: (i) o recuo da globalização e
ausência de um discurso para a mesma que não se renda às meta-empresas globais;
(ii) o efeito do progresso técnico (automação, robotização, …) na destruição de
empregos na indústria transformadora mais do que os efeitos da globalização;
(iii) a emergência dos populismos; (iv) a contradição entre a melhoria da desigualdade
a nível mundial e o agravamento da mesma nas economias maduras e avançadas; (v)
a falta de rumo da política monetária e o regresso necessário à política
fiscal; (vi) a absoluta carência de uma nova ordem intelectual para orientar a
coordenação na economia mundial; (vii) a tentação do operariado nas economias
avançadas para ceder à sedução dos populismos à direita; e tantos outros.
Mas apesar
de todas as nuvens, negras ou simplesmente cinzentas, Feliz 2017 para todos os
que nos honram com a leitura regular ou esporádica deste blogue. Que a
energia não nos falte para responder positivamente a esse interesse no INTERESSE.
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