(Com tanta coisa interessante para ler e ajudar a compreender os novos tempos e o que me espera neste envelhecimento acelerado, a densidade do que emerge da leitura exige largos períodos de reflexão para digerir tantos pontos de interesse. Assim sendo, a música para tempos introspetivos torna-se uma companhia inestimável e um complemento da própria reflexão. Entre o que se vai comprando de novo e o apelo do stock, já imenso, que espera revisitação, ora domina o primeiro ou se afirma o outro. Para hoje, sem grande vontade para investimento de escrita ao nível dos últimos dias, invoco duas compras recentes, que me têm acompanhado por estes dias …)
Devo confessar sem delongas ou hesitações que, reconhecendo embora a força do streaming e com a sensação de evoluir para um homem das cavernas em matéria de consumos musicais, continuo a ser extremamente sensível ao artefacto dos CD’s e dos discos Vinyl. Talvez para viver com dignidade o declínio do consumo, sobretudo o dos CD’s, as editoras e principalmente as mais artesanais têm-se aventurado por verdadeiras obras de arte, matéria em que o streaming não tem condições para competir, mesmo que também haja matéria nessa área.
Os dois CD’s que aqui invoco hoje pertencem a esse mundo dos artefactos que gostamos de tocar no sentido sensorial do termo.
O primeiro, JANGADA, numa edição da RECORDS e trabalho técnico de gravação, mistura e “masterização” de André Tavares e com o apoio da Sociedade Portuguesa de Autores, traz-nos uma gravação de Mário Laginha ao piano. Bernardo Moreira no baixo duplo e de Alexandre Frazão na bateria. O trabalho de edição artística do CD é de Oli Bentley, Split. Gosto sobretudo da faixa 5 Jangada de Pedra, mas todo o disco é uma delícia de suporte e complemento do silêncio. O talento de composição de Laginha e de interpretação dos três músicos faz o resto.
O segundo disco, revisitado, traz-nos a que considero ser uma das pianistas mais inventivas da nova geração, Joana Gama. O disco chama-se SATIE.150 e é precisamente o seu primeiro álbum a solo (2017), dedicado ao aniversário do enigmático compositor e pianista francês, embora integre composições de John Adams, Arvo Pärt, John Cage e Scriabin.
Uma combinação inesperada, talvez. Mas excelente para os tempos introspetivos que nos desafiam.
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