(Este gráfico, elaborado pelo Financial Times a partir de dados da Capital Economics, coloca em relevo comparativo o crescimento após o período pandémico dos países da Europa do Sul, entre os quais Portugal, com a estagnação da Alemanha e suscita, por isso, um vasto campo de reflexões. No plano estritamente teórico, o mantra do crescimento em globalização e com liberdade de circulação de pessoas, capitais e tecnologia diz-nos que, controlando pelos fatores estruturais que explicam o maior desenvolvimento da Alemanha, os países menos desenvolvidos como os da Europa do Sul deveriam crescer a taxas mais elevadas do que a Alemanha. Essa suposição equivale seja ao jargão da convergência absoluta, em que se comparam apenas taxas de crescimento e nível de desenvolvimento económico e da convergência condicional em que essa comparação exige que se neutralize a influência dos fatores estruturais que condicionam a produtividade. Se permanecêssemos neste registo, a convergência estaria a acontecer, nada de novidade seria destacada e poderíamos dizer que o mencionado mantra estaria de boa saúde e se recomenda. Mas não é assim e um gráfico desta natureza causa algum alarido na Europa, não porque a convergência não fosse saudável, mas fundamentalmente porque ela acontece graças à estagnação alemã e esse não o princípio orientador de tal mantra. O que este diz é que ambos cresceriam, mas os menos desenvolvidos cresceriam mais dada a possibilidade de mobilizarem conhecimento e tecnologia de última geração. Porquê então este alarido?)
Se retirarmos da análise a desigual influência que a recuperação turística pós-pandémica assume na economia alemã, por um lado, e em Portugal, Espanha, Itália e Grécia, por outro, as razões terão de ser procuradas seja em impactos diferenciados da situação mundial nos dois grupos de países, seja em condições internas induzidas particularmente pela situação da economia mundial.
Pelo que vai sendo conhecido, parece claro que as indústrias transformadoras das economias do sul reagiram melhor à crise energética determinada pelo agravamento da guerra da Ucrânia, ao passo que a economia alemã terá demonstrado uma rigidez de adaptação que obviamente teria de traduzir em matéria de desempenho económico. Isto não significa que, pelo menos em Portugal, a transição energética não seja uma ameaça séria para algumas indústrias, talvez com a cerâmica e o vidro à cabeça.
Mas, em meu entender, mais do que uma rigidez energética, e ela existe apesar dos esforços titânicos da economia alemã para escapar à armadilha energética provocada pela condescendência com o modelo russo, o que a economia alemã revela é uma dependência excessiva de aspetos de funcionamento e de organização da economia mundial que a situação mundial obriga inapelavelmente a reconsiderar. Tudo se passou como se do alto da sua indiscutível superioridade industrial e transformadora, a economia mundial entendesse que a economia mundial assim configura era imutável e resiliente, ajudando assim a estabilizar o cálculo económico das condições de investimento. Desses aspetos de organização e funcionamento, a que poderíamos chamar a geopolítica económica, ressalto essencialmente dois: (i) a dependência do mercado chinês para escoamento do seu vasto poder de produção industrial e (ii) a sua dependência no plano dos consumos intermédios para a sua indústria de fornecimentos chineses e do continente asiático. Em meu entender, a questão energética é tão só uma manifestação de um problema mais geral. O que significa que, mesmo se a economia alemã revelar uma elevada adaptação à crise energética, o problema central não está resolvido, já que os processos de ajustamento e adaptação aqui implicados serão necessariamente mais lentos do que os energéticos. Sem surpresa, a tão propalada máquina de produtividade parece também encalhada.
O que temos então é uma locomotiva europeia que já viveu melhores dias e talvez seja tempo de reequacionar a propulsão económica da União. Entretanto, tal como o artigo do FT o assinala, as economias do sul poderão gozar de melhores condições comparativas de financiamento face a períodos anteriores em que o spread face aos valores alemães era ainda muito elevado.
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