(Tenho para mim claro que Passos Coelho era a personalidade do coração de uma direita conservadora e liberal quanto baste na esfera económica para realizar a lavagem ao cérebro do PSD e transformá-lo num partido de direita mais extremada, no limite das condições democráticas. Em torno de Passos Coelho giravam como borboletas militantes jovens como Bruno Maçães o homem do piu-piu como José Pacheco Pereira o zurzia então em crónicas ferozes, Lomba, Sérgio Monteiro e outros que tais que acreditaram que o ajustamento e a TROIKA eram uma dádiva do céu para varrer os tiques”revolucionários” da sociedade portuguesa e impor o modelo que em condições de livre ida às urnas seria praticamente impossível alcançar. Quem hoje relê comentários à época no Observador e as opiniões desse grupo próximo de Passos Coelho compreende que era assim e que para esse universo de ideias foi uma enorme deceção topar com as reais dificuldades de forçar o PSD a esse golpe de rins. A vitória nas eleições pós TROIKA e saída do ajustamento que Passos Coelho protagonizou ainda gerou expectativas junto desse centro de opinião. Mas a maioria de esquerda organizada em geringonça deu cabo dessa tentação, que teria de esperar pelo menos alguns anos para manter viva a esperança. Nessa altura, Montenegro como líder parlamentar do PSD e Hugo Soares, seu principal acólito, convergiram com essa deceção e mantiveram o partido em quase negação face à geringonça, adiando a adaptação a uma nova estratégia de oposição que já não passava pelo símbolo de Passos e seus militantes borboleta. Recordo que por essa altura foi Passos Coelho que pela primeira vez deu a mão a André Ventura e percebeu-se que ali havia algo de mais forte no plano das ideias do que uma simples empatia. Depois de um longo silêncio, Passos Coelho foi saindo da toca, entrou em força na campanha eleitoral ou na sua antecâmara, não sabemos para dizer coisas que Montenegro não podia afirmar ou se para o encostar a uma outra agenda. A publicação do livro Identidade e Família representa, a meu ver, a nova expressão desse regresso com água no bico ou de coelho escondido com cauda de fora.)
Para memória futura deste blogue enquanto ele durar, ou seja, enquanto for suportável o cansaço de escrever quase diariamente e em cima dos acontecimentos, o registo do que hoje aconteceu na cerimónia de apresentação dessa obra merece ser recordado.
Pelas notícias que foi sendo possível captar na comunicação social on line e na televisão, pode pressentir-se a emergência do conservadorismo de pensamento em temas tão sensíveis como a educação pública (a “sovietização” do ensino, a família ou outras formas de comportamento. A razão para o seu aparecimento hoje e não noutra data qualquer antes das eleições não está na vitória curta da AD, mas sim no significado dos 50 deputados do Chega e da massa de um milhão e duzentas mil pessoas que nele votaram. Com uma vitória mais clara da AD e um peso bem menor do Chega no Parlamento a mensagem não teria o mesmo efeito.
Aliás, percebe-se pelas notícias que Ventura e Passos se amam no sentido empático do termo, felicitações de um lado e do outro, retribuições de outros momentos no passado, até a referência a uma possível candidatura presidencial de Passos Coelho foi mencionada. Segundo a jornalista Sofia Rodrigues do Público, Ventura terá dito que “Passos Coelho apela a entendimentos políticos depois de “sinal claro” nas eleições e que o seu discurso inspirado nas “bandeiras do Chega” como a “ideologia de género, a questão da família, da imigração”.
Socorrendo-se da apresentação de uma obra que tudo indica terá feito sair do armário todo o conservadorismo latente no Passos Coelho de hoje e, na minha opinião, de sempre, ele quererá manifestar a Montenegro a sua rejeição do “não é não” preparando o campo para o que os acontecimentos no Parlamento ditarem. Passos Coelho terá atuado como uma espécie de porta-voz de Ventura, ou pelo menos este último o transformou nesse papel, numa espécie de submarino do conservadorismo.
Novidade e surpresa para muita gente?
Para mim apenas a confirmação de uma trajetória anunciada e não por acaso a escolha da tal direita mais conservadora e ultraliberal no plano económico que pensou um dia realizar o take-over do PSD e talvez não tenha desistido da ideia.
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