Foi com aparente indiferença, um misto
de conformismo e revolta, que a maioria dos portugueses recebeu as declarações
de Vítor Gaspar, esta semana na Assembleia da República. Os que ainda se vão
dando ao trabalho de acompanhar a coisa pública, e de dela guardarem mínimos de
memória, ter-se-ão limitado à constatação de uma unbelievable but true (usando a língua da globalização) falta de
decoro!
Primeiro, a revisão das projeções de
crescimento do PIB. Assim: “Como habitualmente, haverá uma revisão das
perspetivas económicas no sétimo exame regular que terá início já na próxima
Segunda-Feira. Neste momento, o meu julgamento provisório aponta para uma
revisão em baixa da previsão da atividade económica da ordem de um ponto
percentual.” Sim, claro, apenas um mero ponto percentual!
Em seguida, a reafirmação de banalidades
vazias de conteúdo concreto. Assim: “Estão reunidas as condições necessárias
para considerar a política económica e financeira num horizonte mais amplo,
para construir os alicerces para o crescimento sustentado. É do investimento
privado e do crescimento que resultará a criação de emprego. É pela criação de
emprego pelas empresas privadas que se inverterá a evolução do desemprego.”
Sim, claro, enquanto a economia cai e a confiança atinge máximos!
Mais adiante, a renovação daquele
compromisso do “nem mais tempo...”, tantas vezes jurado: Assim: “É razoável
conjeturar que a Comissão Europeia ponderará, em tempo oportuno, propor ao
Conselho Ecofin o prolongamento por um ano do prazo concedido a Portugal para
corrigir a situação de défice orçamental excessivo. (…) O ajustamento
orçamental em Portugal poderia ocorrer de uma forma mais gradual e prolongada
no tempo.” Sim, claro, o bom aluno acabará por merecer quadro de honra!
E, a terminar, a reincidência na querida
austeridade, após um pequeno intermezzo de acesso aos mercados. Assim: “[Medidas] poderão ter que ver com controlo de execução
orçamental em 2013, mas também com a antecipação dos efeitos de poupanças
permanentes associadas com o processo de reforma do Estado.” Sim, claro, as
gorduras feitas poupanças!
O Gaspar que em tempos conheci já era
inteligente, já era educado, já era tímido, já tinha sentido de humor e já
possuía sólida formação económica. Mas era também rigoroso e intelectualmente
honesto, atributos que este ministro das Finanças começa a ter dificuldade em honrar
e prolongar. Será que a atividade política obriga mesmo ao abandalhamento?
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