sábado, 23 de fevereiro de 2013

GASPAR, O GUICHO


Foi com aparente indiferença, um misto de conformismo e revolta, que a maioria dos portugueses recebeu as declarações de Vítor Gaspar, esta semana na Assembleia da República. Os que ainda se vão dando ao trabalho de acompanhar a coisa pública, e de dela guardarem mínimos de memória, ter-se-ão limitado à constatação de uma unbelievable but true (usando a língua da globalização) falta de decoro!

Primeiro, a revisão das projeções de crescimento do PIB. Assim: “Como habitualmente, haverá uma revisão das perspetivas económicas no sétimo exame regular que terá início já na próxima Segunda-Feira. Neste momento, o meu julgamento provisório aponta para uma revisão em baixa da previsão da atividade económica da ordem de um ponto percentual.” Sim, claro, apenas um mero ponto percentual!

Em seguida, a reafirmação de banalidades vazias de conteúdo concreto. Assim: “Estão reunidas as condições necessárias para considerar a política económica e financeira num horizonte mais amplo, para construir os alicerces para o crescimento sustentado. É do investimento privado e do crescimento que resultará a criação de emprego. É pela criação de emprego pelas empresas privadas que se inverterá a evolução do desemprego.” Sim, claro, enquanto a economia cai e a confiança atinge máximos!

Mais adiante, a renovação daquele compromisso do “nem mais tempo...”, tantas vezes jurado: Assim: “É razoável conjeturar que a Comissão Europeia ponderará, em tempo oportuno, propor ao Conselho Ecofin o prolongamento por um ano do prazo concedido a Portugal para corrigir a situação de défice orçamental excessivo. (…) O ajustamento orçamental em Portugal poderia ocorrer de uma forma mais gradual e prolongada no tempo.” Sim, claro, o bom aluno acabará por merecer quadro de honra!

E, a terminar, a reincidência na querida austeridade, após um pequeno intermezzo de acesso aos mercados. Assim: “[Medidas] poderão ter que ver com controlo de execução orçamental em 2013, mas também com a antecipação dos efeitos de poupanças permanentes associadas com o processo de reforma do Estado.” Sim, claro, as gorduras feitas poupanças!


O Gaspar que em tempos conheci já era inteligente, já era educado, já era tímido, já tinha sentido de humor e já possuía sólida formação económica. Mas era também rigoroso e intelectualmente honesto, atributos que este ministro das Finanças começa a ter dificuldade em honrar e prolongar. Será que a atividade política obriga mesmo ao abandalhamento?

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