Recupero a minha noite de Quinta-Feira
em Serralves, onde foram apresentados os resultados de um louvável exemplo de
transparência e accountability dado pelo
respetivo Conselho de Administração: a encomenda de um estudo à “Porto Business
School” sobre o impacto económico imputável à Fundação.
Eis a sua conclusão mais forte: o
“complexo artístico” gerido pela Fundação terá acrescentado cerca de 41 milhões
de euros à riqueza nacional, pago em torno de 20 milhões de remunerações, contribuído
para a criação de 1296 postos de trabalho, envolvido quase 700 mil pessoas (perto
de 200 mil não nacionais) e entregue ao Estado um valor em impostos a rondar os
11 milhões de euros. Ou seja, terá havido efetivo retorno para os 4,1 milhões
de euros de dinheiro público concedido e terá ficado demonstrada a ligeireza e
mesquinhez com que o Governo tem abordado o dossiê do financiamento à cultura
em geral e às fundações em particular.
Quanto ao resto de uma sessão muito
rica, sintetizo-o em uma confirmação, duas surpresas e três referências curiosas.
A confirmação veio de Carlos Costa, o governador do Banco de Portugal que foi
convidado a comentar o estudo – por coincidência coordenado pelo seu irmão José
Costa, numa première entre os dois ao
cabo de 41 anos de atividade profissional largamente contígua. Carlos começou
por lembrar Vasco Airão para depois elaborar sobre a importância da cultura e
do intangível no desenvolvimento, sobre o conceito de “capital social”, sobre
instituições culturais dinâmicas (versus inertes), sobre a significância de
sinais de modernidade na projeção da imagem de um território, sobre
criatividade e inovação, sobre “criação de contexto” e de ambientes de
inquietação. Em grande forma!
As surpresas vieram do lado do PSD e dos
seus dois representantes em palco. Paulo Rangel, mais solto do que o habitual,
ajudou a fazer as honras da casa com uma graça e um sentido de oportunidade que
nem sempre consegue pôr nos seus desempenhos públicos – como quando afirmou,
sorrindo, que “afinal há parcerias público-privadas boas” e que não deviam ser
essas a levar os cortes ou como quando sugeriu haver necessidade de se dizerem
coisas nas instâncias europeias. Carlos Moedas, o secretário de Estado adjunto,
encerrou as intervenções de um modo totalmente inesperado – um guião
inteligente, uma presença simpática e uma atitude aberta – para quem apenas o
conhecesse das tristes aparições públicas que tem protagonizado; citou Keynes,
com quem disse ter aprendido a ser cético em relação à falsa precisão,
confessou ter acabado por aderir à ideia de um impacto da cultura na economia,
alargou a coisa ao valor económico da língua portuguesa e à economia social,
disse que a economia não é “uma coisa das nove às cinco” e não esqueceu mesmo um
tributo ao jovem Gaspar há vinte anos contratado por Teresa Gouveia para
abordar a matéria.
Por fim, três citações pontuais mas de
forte simbolismo. Rangel, após uma leitura algo pobre de Marx como arauto da vitória
da infraestrutura económica, a postular que haverá sempre um reduto da cultura
que escapará à economia. Moedas, numa interpelação sobre o valor último de
Serralves e tendo em conta o muito que ainda é incalculável, a interrogar se
alguém ainda conseguirá imaginar o Porto subtraído de Serralves. Luis Campos e
Cunha, fazendo um paralelismo com Nova Iorque não ser os Estados Unidos mas só
poder existir lá, a sublinhar que Serralves também só podia ter acontecido no
Porto.
Haverá ainda a registar que ninguém
entoou o “Grândola Vila Morena”. Embora daí não tivesse vindo qualquer mal ao
mundo…
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