terça-feira, 10 de setembro de 2013

FIM OU REINVENÇÃO?

(Kipper Williams, http://www.guardian.co.uk

Não será propriamente o fim da Nokia, mas é certamente o fim definitivo de uma época que chegou a ser dourada para a multinacional de base finlandesa que, com quase 150 anos de história, tem sido largamente apresentada como um ícone nacional e europeu e se foi constituindo num dos mais citados case studies das grandes escolas de negócios. Depois de várias e discutíveis derivas estratégicas nas últimas três décadas (por vezes quase ao jeito de “montanha russa”) e dos respetivos reflexos em termos financeiros (incluindo ameaças de falência e fecho), o efetivo princípio do fim deu-se há seis anos, quando a Apple introduziu o iPhone e a Nokia se dava ao luxo de descansar à sombra dos louros associados à dominação que conquistara – nada mais, nada menos do que um clássico da gestão e estratégia empresarial…

Senão vejamos: os variados dados recolhidos no quadro abaixo (“Financial Times”, a partir de fontes como a Bloomberg, a Gartner e a Thompson Reuters) permitem fazer uma breve mas chamativa crónica estatística de algumas componentes mais recentes de uma queda dramática e que ia sendo sucessivamente anunciada de todos os pontos de vista (indicadores financeiros, cotação das ações, venda global de dispositivos móveis e quota de mercado nos smartphones a nível global). De sublinhar que, neste último caso, a abrupta perda de posição da Nokia (49% do mercado em 2006 para 3% na primeira metade do corrente ano) a tinha já colocado de fora do top five internacional de construtores.


Era já publicamente conhecida a aproximação verificada, desde 2010/11, entre a Nokia (fabricante de telemóveis) e a Microsoft (operadora de sistemas), numa arriscada aposta combinada entre o então recém-chegado da Microsoft CEO da Nokia (Stephen Elop) e o agora de saída CEO da Microsoft (Steve Ballmer). Neste sentido, a recente aquisição por 5,4 mil milhões de dólares do negócio de telemóveis e do licenciamento de patentes da Nokia por parte da Microsoft corresponde a um prolongamento natural daquele primeiro passo que levou a Nokia a abandonar o seu sistema operativo em benefício da plataforma Windows da Microsoft. Mas a dimensão do desafio, que alguns reputam de impossível, está bem à vista no quadro seguinte (mesmas fontes), o qual evidencia o atraso competitivo global dos telefones baseados neste software por comparação à Google (Android) e à Apple (iOS) – 3,3% contra 79% e 14,2%, respetivamente (93,2% conjuntamente). Sendo ainda de sublinhar o impacto que todas estas movimentações tem tido em termos de mercados acionistas (gráfico mais abaixo, em que o preço das ações surge recalculado com relação ao boom das dotcom de março de 2000), remunerando muito significativamente a Apple e a Samsung, estabilizando as cotações da Microsoft e penalizando fortemente a Nokia.



É em todo o caso certo que nada mais será como dantes. Do lado da Nokia, a companhia deixa definitivamente de ser um fabricante e prestador de serviços na área dos aparelhos telefónicos para passar a ser basicamente uma empresa de redes e equipamento de telecomunicações, através da sua divisão NSN maioritariamente controlada pela Siemens; ainda permanece uma incógnita sobre as opções que fará no tocante à sua cash cow de muitos anos (telemóveis básicos), uma área que perdeu visibilidade face à batalha em curso nos smartphones e a contas com uma crescente e downgraded concorrência-preço associada à forte procura proveniente de países emergentes.
 

 
Do lado da Microsoft, o trabalho que os seus responsáveis têm à frente afigura-se hercúleo (e de muito duvidoso sucesso, a crer nas análises dos especialistas e nas imediatas antecipações negativas dos mercados): completamento da aquisição e reestruturação, apropriação de sinergias, afirmação da sua plataforma junto de outros operadores e consequente criação de massa crítica, desenvolvimento de oportunidades em outros dispositivos, tablets e PCs. Finalmente, e do lado geoestratégico, o que vai sendo observado indicia como facto adquirido que a Europa vá ser uma parte cada vez menos relevante nas profundas mexidas que o setor das telecomunicações irá inequivocamente continuar a experimentar a nível global...

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