(Dois gráficos já "velhinhos" do Economst a propósito da estagnação secular)
(À medida que as economias
avançadas parecem enredadas numa armadilha de crescimento e que as taxas naturais
de juro se perfilam no horizonte de longo prazo como prolongadamente baixas, as coisas parecem dar razão à insistência de
Lawrence Summers)
Por haver muito boa gente que queira enterrar o conceito
de estagnação secular, associando-o irreversivelmente aos anos 30 de Alvin
Hansen, enterrando simultaneamente a finura do próprio Keynes, considerando-os
coisas para um baú do esquecimento, isso não significa que o tenhamos de fazer.
A insistência de Lawrence Summers no tema e no conceito, se bem que atendendo
ao seu prestígio académico e mediático seja uma força de peso, acontece não por
teimosia exibicionista mas porque a simples “evolução das coisas” concede
margem de manobra à sua difusão e à geração de investigação empírica suscetível
de consolidar a abordagem.
O próprio Summers interroga-se sobre essa influência do
andamento concreto das economias avançadas e da taxa real natural de juro para
explicar como a ideia está em consolidação. Os economistas têm esta atração
pelo abismo que deve deixar outros homens de ciência como os físicos
estarrecidos. No seio de toda esta vasta controvérsia está um conceito, a taxa
real natural de juro, que não é realmente observável, é uma construção
meramente teórica que tem de ser aproximada por métodos indiretos, nada se
parecendo com a epopeia da demonstração de que as ondas gravitacionais induzidas
por um choque algures no tempo entre dois buracos negros existem e podem ser “ouvidas”.
Ora, para não introduzir complexidades desnecessárias, a taxa real natural ou
neutral de juro seria a taxa que equilibraria a poupança e o investimento
necessários para atingir o pleno emprego da economia. Na formulação de Summers,
a estagnação secular acontece quando essa taxa real natural de juro é demasiado
baixo de modo que não é facilmente atingida com políticas convencionadas
centradas nos bancos centrais. Todas as evidências indiretas convergem para essa
conclusão. As taxas de juro de longo estão muito baixas. As expectativas de
inflação a longo prazo estão muito longe das metas de 2% assumidas pelos bancos
centrais. O valor baixo das primeiras a longo prazo sugere que os investidores
não antecipam inflação elevada para o longo prazo, o que é também sugerido pela
evolução dos títulos indexados à inflação. Por isso Summers não abandona a sua
ideia de que o mundo vive um problema de procura global, com a poupança desejada
e concretizada pelos agentes económicos a exceder o investimento.
Como é óbvio, fatores mais abrangentes explicam complementarmente
o comportamento da poupança e do investimento. Quanto à poupança, desde Keynes
e seus seguidores se sabe que uma distribuição do rendimento favorável aos
rendimentos mais elevados favorece o crescimento da poupança. Os mais riscos
poupam proporcionalmente mais do seu rendimento que os mais pobres. Quanto ao
investimento, a ausência de novos universos de oportunidades de investimento e
a descida do preço relativo do capital reduzem a massa de investimento desejado.
Mas as implicações da insistência de Summers não ficam
por aqui. Todas as evidências dos últimos tempos mostram que a política monetária,
mesmo assumindo cambiantes de uma contorcionista imaginativa, multiplicando-se
em surpresas e medidas não convencionais que deixam os mais ortodoxos
furibundos e na eminência de um ataque de nervos, começa a dar sinais de não
poder fazer mais, sem ter entretanto resultados palpáveis. E até pode dizer-se
que começam a emergir efeitos perversos. Veja-se por exemplo a reação dos
investidores antecipando que a banca lidará mal com as medidas não convencionais
e perderá capacidade de geração de valor a prazo.
E, nestas situações, podemos disfarçar, dar voltas e assobiar
para o ar. Mas quando a política monetária, travestida das incursões menos
ortodoxas, dá sinais de não resolver por si só a situação, é altura da política
fiscal e do investimento público regressarem do além.
Mas, tragédias das tragédias, nem todos os países estarão
nas mesmas condições para ensaiar a última, a verdadeira das bazucas. No quadro
do xadrez europeu, seria necessário que os menos endividados do Norte fizessem
o seu papel para que os mais endividados e com menor margem de manobra tirassem
disso benefício, se não houver reestruturação de dívida que se veja. A
incapacidade europeia para pôr em execução o Plano Juncker diz bem da inércia
que estamos a falar.
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