(A cedência do
Conselho Europeu, retratada no draft do documento TUSK, às pretensões de David Cameron
para poder defender a permanência do Reino Unido na União em referendo próximo representa a confirmação de uma União
Europeia à la carte, em que o menu reflete a dimensão dos poderes em confronto)
É curioso confrontar a reação impressa de dois influentes
jornais europeus quanto ao acordo que Cameron parece ter alcançado relativamente
à sua negociação com as instituições europeias para poder defender em referendo
a permanência do Reino Unido na União Europeia. O referencial para essa interpretação
é o draft de decisão de 2 de fevereiro
de 2016, EUCO 4/16, assinado pelo presidente do Conselho Europeu, o polaco Donald
Tusk.
O Financial Times não hesita em considerar o resultado da
negociação “um acordo razoável para manter a Grã-Bretanha
no Reino Unido”. Por seu lado, o El País pela pena de um dos
seus cronistas políticos mais conhecidos, Xavier Vidal-Folch abre a sua crónica
com o seguinte título e subtítulo: “Uma vergonha:
tudo é retrocesso – o pior do pacote Tusk é o corte de certos benefícios
sociais aos emigrantes comunitários”.
Nesta curta reflexão após a leitura das 16 páginas do acordo-draft,
sobreveio esta avaliação de circunstância. Se o projeto europeu fosse neste
momento um processo imaculado e de grande democraticidade, estaria aqui a
vociferar contra a arrogância britânica e contra a eterna contradição de estar
não estando nesse projeto europeu, já que aos britânicos interessa apenas a
questão do mercado único e nem sequer o seu alargamento às questões de um mercado
de trabalho mais fluido. Mas o projeto europeu é nos últimos tempos tudo menos
um projeto de aprofundamento da democracia. Assim sendo, os recortes
nacionalistas invocados por Cameron para combater o euroceticismo que se
apresentará em força no referendo de 2017 acabam por ser um lance racional de
movimentação numa União Europeia à la carte em que o menu reflete a linguagem
estrita do poder, sobretudo do poder económico.
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