domingo, 17 de setembro de 2023

WHATEVER, AGAIN?

 

O acontecimento europeu da semana foi indiscutivelmente o discurso do Estado da União (SOTEU) da presidente da Comissão (Ursula von der Leyen) em Estrasburgo. Um discurso de 63 minutos, meticulosamente preparado e cheio de sinais dirigidos aos mais variados destinatários, dir-se-ia que confirmando o vaticínio da “Politico” de que se iria tratar do “começo de uma não-campanha”. Longe vão os tempos de 2019 em que a ex-ministra da Defesa alemã era lançada para o cargo, suscitando dúvidas (fundadas, há que confessar) quanto às suas competências e estatura para o lugar (right skills, referiu a “The Economist”). Essa questão está hoje fora do alinhamento atual dos analistas e já ninguém tem põe em causa que a senhora é capaz porque claramente tesa e focada, quiçá apenas demasiado renitente a praticar o tipo de liderança que melhor se ajusta a um “clube” com muitos e altamente diferenciados sócios. Mas se já poucas dúvidas existiam sobre a sua vontade de fazer um novo mandato ― coisa diversa é se Macron e Bretton deixam em nome de uma salvaguarda do equilíbrio franco-alemão, como já aqui apontei em post passado ―, obviamente que aquele não era ainda o momento azado para o referir explicitamente (assim se ficando pela modesta proclamação do objetivo de usar os próximos 300 dias para finalizar a tarefa que lhe foi confiada).


(cartoon de Peter Schrank, https://www.economist.com)

Vários tópicos importantes integraram o speech presidencial (com o Verde e o Digital a servirem de grande guia orientador). Mas se tivesse de escolher um diria que ele deveria ser o da insistência de Ursula naquele que se tornou a sua grande obsessão: o alargamento da União (matéria que abordei em post recente, datado de 11 de setembro, e para o qual remeto). O assunto é sério e inquietante, quer pelo seu inequívoco valor facial (nos estruturantes termos de condições de sobrevivência que tratei naquele post) quer porque não estou certo de que ele não venha a corresponder também a mais um elemento decisivo para uma acrescida deslocação do centro da União para a Europa Central e Oriental em detrimento da Europa do Sul. Em nome, sublinhe-se de um conceito vago e de conteúdo impreciso como é o de “Europa geopolítica”.


Neste quadro, alguns cirúrgicos pormenores complementares foram trazidos adicionalmente à colação. Um deles foi o de um aviso à China através do anúncio de uma investigação quanto à sua indevida subsidiação do setor de automóveis elétricos. O outro esteve no verdadeiro número que constituiu o anúncio da encomenda feita a Mario Draghi (mencionado como one of Europe’s great economic minds) no sentido de ele lhe preparar um relatório sobre o futuro da competitividade europeia (porque, enfatizou, a Europa fará whatever it takes para manter as suas vantagens competitivas).


(cartoons de Pierre Kroll, http://www.lesoir.be e ïoOhttps://www.lesechos.fr)

Ursula parece imparável, pois. A ponto de quase ser de apostar em que, mesmo que Scholz lhe peça que faça uma reorientação para o comando da NATO, ela também tudo fará para continuar a habitar o Berlaymont. Whatever it takes. Em todo o caso, tendo ela colocado com segurança as suas pedras em campo, a vez de jogar passa agora para outras mãos.

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