domingo, 3 de setembro de 2023

CONVIVIALIDADE URBANA

 


(Nada melhor do que o tema da convivialidade urbana para assinalar o regresso de férias, já que somos habitantes de Cidade e no meu caso particular tenho um fascínio particular pela convivialidade que é ainda possível recriar nas Cidades qualquer que seja a sua dimensão. O artigo que inspira esta reflexão de regresso ao trabalho fez-me lembrar a atividade incessante do meu Amigo José Carlos Mota da Universidade de Aveiro sobre as diferentes formas de trabalhar a Cidade de proximidade. A inspiração vem de uma França cada vez mais heterogénea nesta matéria e chegou à primeira página do New York Times internacional desta semana e tudo gira em torno do pensamento de certamente um José Carlos Mota lá do sítio, Patrick Bernard, jornalista e fundador vejam lá da República da Super Vizinhança em Paris.)

Sempre entendi que a convivialidade urbana não resulta de grandes eventos ou infraestruturas, mas antes da proximidade e das relações entre as pessoas que a cultivam.

Escreve Patrick Bernard:

A convivialidade é uma riqueza que está adormecida. Quando despertamos o sentido de lugar e de comunidade, os cidadãos e o tecido urbano transformam-se.”

Que simplicidade profunda! Sempre entendi que embora possa ser considerada uma condição facilitadora, não é a dimensão infraestrutural do espaço público que faz a convivialidade urbana. Sempre recorri ao conceito de atmosferas urbanas para afirmar este meu princípio. E as atmosferas urbanas estão para lá do campo físico do espaço público. Resultam da interação entre pessoas com sentido de lugar e propensão para viver a proximidade e vizinhança.

Neste caso, o movimento liderado por Patrick Bernard em cerca de 50 ruas no 14º Arrondissement é mais uma tentativa de revitalizar a convivialidade urbana estimulando relações de vizinhança e de proximidade mais intensas, como aliás a imagem que o artigo do New York Times recupera o sugere. É de rua e de esplanada de um café que falamos e não de um vigoroso projeto de espaço físico urbano encomendado a um arquiteto de nomeada. É de uma liderança urbana que se trata e que projeta apenas este convite, venham e tragam um pedaço de queijo e é conhecido o sortilégio de cerca de 300 tipos ou mais de queijos franceses que fazem a minha delícia quando frequento as feirinhas francesas ou fico zonzo perante a montra de uma queijaria de qualidade.

Mas será que toda a França está em condições de desenvolver projetos desta simples invocação da proximidade? Nem por sombras, como aliás nos chegam ecos de todo o lado, com cidades e bairros franceses submetidos à polarização profunda, cheios de raiva, revolta e violência, lugares em que as conversas do queijo dão lugar à destruição de espaço público e à intimidação. Mas a França conserva ainda este potencial de organização urbana alicerçada nos bairros e vizinhanças de três minutos, aquilo que Patrick Bernard designa de microvizinhanças. Ou seja, mais do que grandes obras infraestruturais, o fundamental parece ser suster e inverter a degradação de alguns espaços e apelar à dimensão mais humana da convivialidade.

 

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