quinta-feira, 21 de setembro de 2023

REGRESSO A LAMPEDUSA

(Simon Regis e Hassan Bleibel, https://cartoonmovement.com) 

Já não há palavras que cheguem para denunciar o que se passa na Europa em relação à questão dos refugiados/migrantes que a buscam desesperadamente sob as mais variadas rotas com principal proveniência de África e do Médio Oriente. Porque tudo é demasiado mau, da luta sem limites pela sobrevivência dos protagonistas e vítimas à essencial impotência dos países-alvo por fronteiriços, da postura aflitivamente cínica e enganosa dos responsáveis destes (Meloni foi uma ilustração risível de inconsequência) ao manifesto desinteresse (quando não à ativa confrontação) dos restantes países comunitários, do recurso ao marketing político de Ursula e dos grandes decisores bruxelenses ao chocante aproveitamento da oportunidade por parte das autoridades dos países de origem (foi a Turquia, esperava-se que tivesse sido agora a Tunísia).

 

Desta vez, a crise (alguém batizou os seus resultantes contornos de afritaly) eclodiu em Lampedusa, a ilha imortalizada em romance por Giuseppe Tomasi di Lampedusa e no cinema por Luchino Visconti (com Burt Lancaster, Claudia Cardinale e Alain Delon). Com Meloni a socorrer-se de Ursula para enfrentar uma situação em que só soube falar demais, a presidente alemã da Comissão a fazer o seu número pessoal e, pior de tudo, vários (ir)responsáveis europeus a logo se virem declarar contrários a uma solução comum (o que constitui, aliás, a única via para que algum caminho possa ser feito). Sejam eles os polacos, já conhecidos pela sua lógica antieuropeia (ademais em pleno período eleitoral ― Europe will become Lampedusa, diz-se por lá), ou os alemães, com os Liberais (no governo) a declararem-se opositores a uma ajuda à Itália. Por este andar, o corrupio de viagens, negociações, discursos e promessas vai desembocar numa reedição trágica do sentido da frase mais famosa do filme acima citado, aquela em que o Príncipe de Salinas refere que “é preciso que alguma coisa mude, para que tudo fique na mesma”.

(Marinela Nardi, https://cartoonmovement.com)

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