sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

PARA DESANUVIAR

(As detetives Liz Danvers (Judie Foster) e Evangeline Navarro (Kali Reis) na noite mais profunda da pequena e infernal cidade de Ennis

(Alinho totalmente com a perspetiva do meu colega de blogue sobre o ambiente irrespirável que se vive nas televisões portuguesas em torno da sucessão infernal de debates entre lideranças de forças políticas. Na rádio, já não é questão que me preocupe, pois há já longo tempo que me circunscrevo à Antena 2, na qual procuro um complemento à minha fraca, porque inexistente na idade adequada, formação musical. O inferno dos comentadores políticos adensa a vacuidade de alguns dos debates e, por isso, considero ser uma condição de preservação da sanidade mental manter-me afastado desse ruído e neste período aproveitar outras oportunidades televisivas ou então recorrer à leitura, atacando os vários montes de livros que aguardam nas secretárias de Gaia e de Seixas a sua oportunidade. Nos canais de streaming há material relevante que é necessário picar com critério e mesmo pelos canais acessíveis numa assinatura de cabo vulgar existem também formas de se abafar o insuportável ruído provocado pela diversidade de debates e sobretudo pelo efeito de eco que as hordas de comentadores trazem ao debate político.)

Rumando pelos lados da HBO, confesso que não dei a devida atenção às três temporadas iniciais da série TRUE DETECTIVE, criada por Nic Pizzolatto e que em janeiro deste ano abriu uma nova temporada, largamente badalada nos jornais americanos e que, provavelmente por isso, despertou a minha atenção. A quarta temporada chama-se NIGHT COUNTRY e centra-se numa pequena cidade ficcional do Alaska, Ennis, com a cidade de Anchorage como referência mais próxima. Não sei explicar porque motivo, mas o Alaska e o longínquo da neve profunda exercem sobre mim um fascínio um pouco doentio, sobretudo porque não tive pessoalmente qualquer experiência nessas latitudes. A minha referência mais próxima é a Noruega, e não muito lá para cima, para assistir a um dos fenómenos naturais mais deslumbrantes e esperançosos a que alguma vez assisti, o degelo dos meses de maio e junho com a água como ator principal.

A série foca-se no infernal período em que durante largo tempo é sempre noite e percebe-se inicialmente que há um conflito latente entre a população local, com uma forte componente nativa e uma fábrica industrial e mineira existente na cidade, com problemas de poluição a atormentar não só o imaginário mas as condições de vida quotidianas dos seus habitantes. Neste universo de neve e noite profundas e avassaladoras, aparecem mortos em condições estranhas e algo fantasmagóricas e macabras quanto baste os membros de uma exploração científica radicados na região há já algum tempo. Em torno desse macabro acontecimento, duas personagens centrais, mais propriamente duas mulheres, as detetives Liz Danvers and Evangeline Navarro, política nacional e local, respetivamente, representadas por Judi Foster, que regressa assim à televisão, e Kali Reis, esta na pele de uma polícia negra e nativa, ocupam amplamente toda a trama, iniciando, primeiro a contragosto, depois com uma forte ainda que contrariada afetividade, uma cooperação que envolve a reabertura de um outro crime anterior.

Filmada na Islândia e dirigida pela mexicana Issa Lopéz, o caráter opressivo e fantasmagórico de uma grande parte das cenas é a imagem de marca dos quatros episódios que estão para já disponíveis. Repetem-se os aparecimentos de ursos polares gigantes que irrompem no nada na paisagem de neve profunda, sucedem-se laranjas que rolam dos sítios mais imprevistos e emergem figuras que não se sabe bem se são zombies de fim do mundo ou construções oníricas de personagens mais propensas à glorificação do sobrenatural.

Fiquei alertado por alguma controvérsia de pendor machista que emergiu na imprensa americana sobre o facto de se tratar de uma série em que duas heroínas comandam toda a trama. E de facto a presença de Foster e de Reis dominam toda as cenas, personagens atormentadas em que o álcool e o sexo surgem como elementos compensatórios de vidas atormentadas. Até agora, cada episódio exerce um efeito de ficarmos amarrados ao écran como há muito tempo não experimentava no aconchego da poltrona televisiva.

Espero ainda mais mistério nos episódios seguintes. O ideal para desanuviar até ao clímax do 10 de março.

Mas há outras alternativas. Para mim no Fox Crime (agora Star Crime), a Testemunha Silenciosa é já para mim uma obsessão dos fins de tarde. Creio que já sei alguma coisa de patologia forense tantos episódios já visualizei. E no Star Movies tem passado uma grande parte da filmografia de John Ford. Para quem não tem a Cinemateca ao pé, sempre é uma alternativa decente.

Cuidem-se do ruído eleitoral.

 

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