( Gorka Lejarcegi para o El País)
Existe uma perceção generalizada de que o
processo de gestão da crise Lehman Brothers e dos seus efeitos em território
europeu, sobretudo do seu posterior encadeamento com a crise das dívidas soberanas
dos países da zona euro, tem que se lhe diga. Começando pela viragem de posição
das instâncias comunitárias que inicialmente a afrontaram segundo a perspetiva
do estímulo fiscal e rapidamente rodaram para o seu oposto, há informação que
falta sobre o contexto que determinou tal modelo de gestão da crise.
Sem documentos que permitam captar esse contexto
para lá do “comuniquês” das declarações oficiais então produzidas, estaremos
nos próximos tempos limitados aos relatos dos protagonistas, especialmente dos
que se retiraram de cena. Nestas coisas, os espanhóis, mais fogosos, tomaram a
dianteira. Zapatero com o El Dilema foi
o primeiro político europeu a formalizar memórias (recentes) sobre tal processo,
com a particularidade de Pedro Solbes, seu ministro das Finanças até janeiro de
2009, ter também publicado os seus Recuerdos.
Pela entrevista que concedeu há duas semanas ao novo suplemento dos domingos do El País, não me pareceu que a
capacidade reflexiva de Solbes vá produzir uma obra apaixonante, assim como o
talento de Zapatero também não me parece suficientemente abundante para uma
grande reflexão sobre esses tempos de vertigem. Da entrevista de Solbes fica a
anunciada ideia de que perante o plano de redução de gastos orçamentais por
parte de Solbes a Zapatero, este ter-lhe-á dito: “Pedro, este documento (com as
tuas propostas) é inaceitável: o que propões tem implícitas duas greves gerais”.
Bem mais interessante é a sua posterior afirmação de qualquer governo é um
governo de coligação entre o ministro das Finanças (que controla os gastos) e
os restantes ministros (que querem gastar), exigindo por isso uma sólida relação
entre aquele e o primeiro-ministro.
Por cá, a opção de Sócrates pelo que esta semana
o veneno letal de Pulido Valente designava de “ a redação de mestrado” sobre a
tortura em democracia e não por um livro de memórias recentes inviabiliza a
continuação pela banda de cá do pioneirismo espanhol. Seria interessante
analisar em letra de escrita o modo como Sócrates e Teixeira dos Santos se
refeririam ao tal processo de gestão da crise, em termos mais abrangentes do
que o já comentado caso do PEC 4. Assim sendo, o contraponto Zapatero-Solbes
parece não ter continuidade. E, pelo lado dos gregos, quaisquer memórias sobre
a gestão da crise talvez necessitassem de rigoroso controlo editorial, pois linguagem
desabrida e justificada caracterizaria provavelmente os registos.
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