(Enquanto procurava por outra informação de base estatística, reconstituí
uma série OCDE -link aqui - sobre o comportamento dinâmico da produtividade total dos fatores
entre 1985 e 2016, cerca de três décadas marcadas por transformações relevantes.
O que vemos no gráfico de abertura
a este post é um comportamento
recente que inspira alguma reflexão, sobretudo a partir do tipo de interpretações
que costumam ser associadas a este indicador.)
A produtividade total dos fatores (PTF) é dos tais indicadores económicos que
evidenciam bem as dificuldades e as limitações de algumas das ferramentas analíticas
com que os economistas mais macro trabalham. Se nos reportarmos a um modelo de
crescimento económico em que este é influenciado por dois fatores de produção,
capital e trabalho, a produtividade total dos fatores medirá teoricamente a influência
sobre o crescimento das variações que não possam ser reportadas exclusivamente
a cada um dos fatores. A PTF é, assim, um resíduo explicativo, como dizia Solow
a medida da nossa ignorância relativamente aos fatores para além do capital e
do trabalho e das suas produtividades que influenciam o produto. Para um modelo
de crescimento mais sofisticado, em que para além do capital e do trabalho, tenhamos
por exemplo o capital humano (as qualificações do trabalho) e o conhecimento
medido por exemplo pelo ritmo de produção de ideias com valor económico, a PTF
representará um resíduo “mais residual”.
A PTF representa numa certa perspetiva uma relação de amor e ódio entre os
economistas e os indicadores à sua disposição para explicar o crescimento. Podemos
associar-lhe uma certa interpretação, mas acabamos sempre por remoer as suas limitações.
A interpretação mais comum atribuída à PTF é que a sua variação mede a
eficiência global da economia, o modo como ela combina dinamicamente os seus
recursos (fatores de produção). A PTF seria, assim, uma medida do crescimento
intensivo, em contraponto à influência das quantidades físicas de capital e
trabalho. Quando a PTF evolui a taxas negativas, estaremos perante sintomas de
baixa eficiência global. Há quem associe a esta interpretação os custos de
contexto (justiça, qualidade da administração e outras variáveis do tipo), mas
não será por isso que as palavras de Solow soarão reconduzindo-nos à dura
realidade da fragilidade da medida.
Com este contexto, a reconstituição da série OCDE da PTF esclarece-nos que
depois de uma longa trajetória descendente, a PTF dá alguns sinais de poder
iniciar uma trajetória de crescimento mais regular. Parece evidente também que os
primeiros anos da integração europeia foram anos de elevado crescimento da PTF.
Só mais recentemente, mais especificamente no ano de 2010, o ritmo de variação
da PTF teve um pequeno pico, embora ainda inferior aos picos dos anos dourados
da integração europeia.
Esta informação sugere alguma coisa mas não explicita nada de concreto. Pressentimos
que a economia portuguesa debate-se com vários tipos de ineficiência global,
mas a medida da nossa ignorância não nos abandona. São questões organizacionais
que puxam para cima os custos de transação da atividade empresarial em
Portugal? É a qualidade da administração e da justiça que compromete a
virtuosidade da combinação de fatores? São as baixas qualificações médias que
influenciam essa capacidade de bem combinar? Não sabemos. A PTF desperta a
nossa curiosidade. Uns encolherão os ombros e dirão “que se lixe”. Outros, com modelos
adequados e curiosidade organizada irão esgravatar o resíduo e expurgá-lo do
que podemos conhecer e imputar ao crescimento. Face à não divulgação de trabalhos
nesta última direção, não sei se o encolher de ombros é o predominante. Ou se a
investigação está em curso e dará resultados.
E assim, com tantas limitações, ainda trabalhamos com um conceito que data
de meados dos anos de 50 com os trabalhos de Solow, que foi o primeiro a
reclamar toda a acautela do mundo para interpretar os valores.
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