segunda-feira, 22 de agosto de 2022

EVIDÊNCIAS DE VERÃO

                                                                                 


(Gente de mais para meu gosto pelas bandas de Moledo e Caminha, com televisão à mistura a complicar ainda mais os problemas de estacionamento na segunda semana de agosto, logo necessidades acrescidas de recato, pasmaceira, leituras e o blogue é que paga. Regresso às lides, pensando sobretudo na espantosa e diversificada evidência que nos vai chegando de todo o mundo, país nosso incluído, sobre o inferno climático que paira sobre as nossas cabeças, ainda incapazes de perceber que é tempo de mudança de comportamentos, haja ou não os incentivos certos para a promover.

A leitura dos jornais traz-nos a evidência irrecusável de que os extremos climáticos se tocam, ondas de calor, seca extrema, inundações devastadoras com por exemplo a surpreendente notícia de que o Parque Nacional do Vale da Norte nos EUA fechou devido a inundações de outro mundo, num sítio em que as autoridades americanas nos aconselharam determinado dia a não visitar já que nesse dia a temperatura atingia os 50º e o risco dos pneus arderem era muito elevado. Outra notícia surpreendente é a da seca nos fiordes noruegueses, terra cujo pacto com a água e a sua abundância (o degelo de maio e junho na Noruega é das coisas mais belas que presenciei), evidência que mostra uma espantosa diversidade de incidência geográfica. E, em França, o Monsieur Macron vê a sua “aposta nuclear” comprometida pela falta de água nas regiões de implantação das centrais, refreando a produção de energia. No Reino Unido, se as consequências do BREXIT estão quentes, as ondas de calor estão a derreter a fleuma britânica. Por cá, ondas de calor e incêndios múltiplos e com variantes para todos os gostos impulsionadas por ventos caprichosos já entraram no nosso quotidiano, com o risco elevado de serem interpretadas simplesmente como fonte de mudanças e adaptações climáticas (caso do início antecipado das vindimas) e não como avisos sérios para uma lógica mais radical de reconversão total e absoluta de modelos e modos de produção agrícola e não só.

No meio deste vendaval de evidências, tem passado despercebido o velho debate sobre se a resposta é o “decrescimento” ou o “não crescimento”, ou se pelo contrário é possível o chamado “decoupling”, ou seja, avançar na redução das emissões sem que isso implique redução do crescimento económico, apenas alteração do seu conteúdo. Mesmo um país como o Reino Unido (ver gráfico acima) mostra bem como é possível concretizar esse decoupling, fazendo jus à ideia de que se querem diminuir alguma coisa diminuam as emissões, não o crescimento.

             

Conhecem a minha posição de entender o “decrescimento” como a condenação dos países mais pobres à pobreza continuada, enquanto que nós ocidentais, cansados de dar cabo do planeta, evoluiríamos para uma espécie de jejum estratégico. No outro dia, em entrevista a Vítor Gonçalves, a nossa grande cientista Maria do Carmo Fonseca recomendou-nos pelo menos comer menos um terço do que costumamos comer para adiar as sequelas do envelhecimento e claro que fiquei a matutar naquilo.

Por isso, reflexão final, o principal problema parece estar que já não estamos em tempo de adaptação climática tout court, a não ser que alarguemos esse conceito de adaptação à revisão profunda dos nossos modelos de crescimento. A resistência da economia dos combustíveis fósseis será obviamente imensa. Nos EUA, Biden acaba de fazer passar um generoso programa de investimentos destinado ao choque climático, mas nesse programa continua a existir um generoso conjunto de benefícios a processos de captura e sequestro de carbono na produção de petróleo e de gás. Ou seja, há tecnologia que permite evitar a saída para a atmosfera das emissões, que as capta e sequestra e enterra posteriormente em subterrâneos, mas continuando a produção de combustíveis fósseis. Cheira-me (a petróleo e a gás) que foi por aqui que os Democratas conseguiram o apoio do seu recalcitrante membro ao programa de Biden.

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