terça-feira, 25 de novembro de 2014

RETOMA, MAS POUCO



A publicação das previsões económicas da Comissão Europeia (DG ECFIN), que desde há dois anos e em sintonia com o ciclo anual de supervisão económica da UE (“Semestre Europeu”), ocorre três vezes por ano é sempre um momento de significativa e justificada atenção mediática. Mas a teimosa insistência no imediato faz frequentemente esquecer a qualidade das componentes analíticas do relatório que lhes vem associado, como tão bem evidencia o último e recentemente divulgado. Passo a ilustrar.

Começo pela chamada de atenção decorrente dos dois primeiros gráficos acima reproduzidos para a agravada intensidade da presente recessão europeia quando comparada com recessões anteriores ou com recessões em outras zonas. Prossigo com outra chamada de atenção para cinco interessantes caixas que encerram a primeira parte do relatório, com destaque para as três menos metodológicas e de maior conteúdo económico e atualidade: drivers e implicações da debilidade do investimento na UE; desalavancagem do setor privado; impacto da desinflação não antecipada na dívida. A consultar pelos mais focados no conhecimento, limitar-me-ei abaixo a dois simples appetizers.


Sobre o investimento, a Comissão sublinha que “embora as crises financeiras estejam normalmente associadas a períodos prolongados de baixo investimento, a contração de formação de capital observada na UE desde 2008 tem sido particularmente severa, quer em termos históricos quer em comparação com outras economias avançadas”. E ainda que tal evolução “não foi uma caraterística exclusiva dos Estados Membros Vulneráveis (VMS), mas também do coração da Zona Euro e de países fora da Zona Euro” (gráfico acima). A investigação segue depois para o estudo do papel explicativo no débil estado atual do investimento de dimensões como o baixo crescimento (efeito acelerador), a desalavancagem, o reequilíbrio das prioridades, os fatores financeiros e a incerteza. Para concluir: “A debilidade persistente do investimento tem duas implicações dignas de nota para a economia da UE. Primeiro, as diferenças nas taxas de investimento entre Estados membros são um dos principais drivers das historicamente elevadas diferenças nas condições cíclicas. Um alto nível de diferenças cíclicas complica a gestão macroeconómica numa união monetária. E segundo, períodos sustentados de investimento fraco têm também importantes implicações de médio prazo, na medida em que uma baixa acumulação de capital deprime o crescimento potencial.”


Sobre a desalavancagem, e para além de constatar que o endividamento do setor privado não financeiro (famílias e empresas) atingiu níveis recorde durante a crise, a Comissão nota quanto a respetiva redução constitui necessariamente um garrote sobre os agregados macroeconómicos em geral e, especialmente, uma limitação ao crescimento. Mas salienta também, tomando 2008 por base comparativa de referência (ver gráfico acima), que essa redução “só pode ser vista numa dúzia de países da UE e, ainda mais importante, que na maioria dos casos a extensão do ajustamento é apenas uma fração do aumento anterior à crise”, explicitando a clara exceção da Alemanha por ter sido o único país que desalavancou significativamente ao longo dos anos 2000 e que continuou a fazê-lo no período mais recente. Para concluir: “Dado o contexto de baixa inflação na UE, o contributo do crescimento nominal para o processo de ajustamento vai provavelmente permanecer limitado. As simulações sugerem que, embora alguns dos efeitos sobre o nível de atividade já tenham ocorrido, a desalavancagem irá provavelmente continuar a conter o ritmo de retoma, em particular se a maior parte do ajustamento ocorrer mais por fluxos de crédito do que dirigindo-se também diretamente aos enorme volume de stocks.”

Nesta perspetiva, e resumindo uma observação mais próxima dos resultados do modelo utilizado em termos de efeitos esperados na atividade económica dos diversos países, o quadro seguinte põe em destaque as necessidades de desalavancagem de maior alcance: sete países (Grécia, Chipre, Espanha, Irlanda, Portugal, Bulgária e Suécia) a 30% ou mais do PIB, quatro a 20 a 30% do PIB (Croácia, Holanda, Dinamarca e Reino Unido) e quatro outros a 10 a 20% (Estónia, Itália, Hungria e Eslovénia).


Tudo considerado, e numa frase batida, o bom tempo ainda vem longe...

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