quarta-feira, 5 de novembro de 2014

LE PLAT PAYS



Embora a eterna canção de Brel tenha por inspiração a região belga da Flandres ocidental onde a família de Brel vivia, partilho com a maioria dos holandeses a ideia de que a canção também pertence aos Países Baixos, tamanha é a similaridade que o território da canção encontra nesta infinita sequência de água e terra. Daí que exista uma versão holandesa "Mijn vlakke land", também interpretada por Brel. Mas também teríamos a também eterna Le Port d’Amsterdam para evocar Brel.
Já tinha reparado que os holandeses têm uma relação obsessiva com a mayonnaise, não como um simples adereço gastronómico, mas como ingrediente sempre presente na sua alimentação e ainda hoje numa curta libertação após a conclusão da sessão do URBACT tive oportunidade de presenciar o modo ágil e desempoeirado como os holandeses manipulam grandes embalagens de mayonnaise e a vertem com prazer para acompanhar as mais simples batatas fritas, fazendo disso um petisco. Soube também hoje, embora não o presenciando, que uma aventura gastronómica radical dos mais acérrimos defensores da tradição do país consiste em engolir de um só trago pequenos arenques frescos, o que sinceramente tenho dificuldade em visualizar. Sem quaisquer veleidades de radicalismo dessa natureza, tive o prazer de no acolhedor restaurante do Rijksmuseum, profundamente renovado, comer um snack frio que envolvia arenque fresco, alguma mayonnaise, pão bem preto e alguma salada, acompanhado de um copo de chardonnay chileno para celebrar a economia global. Sempre é uma aproximação.
O Rijks e o seu vizinho Van Gogh visitam-se com prazer, sobretudo pelo fascínio que não desaparece com os anos de contemplar Rembrandt, Vermeer, Hals e o atormentado Van Gogh, passando por exemplares praticamente únicos no Rijks de Goya, Monet, só para me lembrar dos mais sonantes.
Quando ao debate think-tank do URBACT trabalhei que me fartei desde esboçar em público um plano para um artigo sobre economia verde (em parceria com um colega eslovaco de Kosice especializado em TIC) até apresentar e discutir a minha comunicação sobre a gestão futura da economia urbana e as suas implicações em termos de competências. A minha abordagem ao tema é construída na base do conceito de inimitabilidade que as cidades procuram, entendida como o produto de combinações de recursos e capacidades (ingredientes), que constituem a essência da inimitabilidade. Esta questão suscitou um vivo debate que eu próprio antecipei, pois o URBACT é uma rede que visa promover a procura de boas práticas como elementos de inspiração. Procurei mostrar que não há qualquer incompatibilidade entre aprender a partir das experiências bem-sucedidas e procurar ser diferente e inimitável durante o maior período de tempo possível. O que o tema nos vem mostrar é que a transferência de conhecimento implica sempre um respeito mútuo por dois contextos, o de partida e o de aplicação. Sem esse respeito e devido tratamento das suas implicações, as boas práticas são uma treta e arrepia-me o modo leviano como a Comissão Europeia promove autênticas procissões de boas e melhores práticas sem atender a estes quesitos. O economista do desenvolvimento espacial, Philippe Aydalot, dizia que era possível importar praticamente todos os ingredientes do desenvolvimento menos a operação em si. Pois é. Os países melhor sucedidos que não estão na fronteira do conhecimento estão irremediavelmente condenados à equação acesso livre à difusão de progresso técnico-inovação. E não há qualquer menoridade em assumir tal equação.

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