Escrevo a uma hora em que a consulta popular do 9N na Catalunha ainda não produziu resultados, a não ser que praticamente 2 milhões
de indivíduos terão votado, pelo menos até às 18 horas. Não é seguro que os
resultados que venham a ser publicados sejam credíveis do ponto de vista da
massa eleitoral que representam. Mas, apesar de tudo isso, a completa
inabilidade do Governo espanhol conseguiu a proeza de despertar um processo de
participação popular de forte significado e o que é mais prodigioso em tudo
isto é que num momento em que o catalanismo se vê seriamente penalizado pelas
dimensões de corrupção que atravessaram o poder de uma das famílias catalães
mais representativas, os Pujol, foi possível trazer às urnas este nível de
participação.
É bem possível que uma larga parte do movimento
popular que suporta as ambições independentistas não tenha uma ideia clara das
implicações de uma eventual independência da Catalunha e muito menos possa
assegurar a sustentabilidade desse passo. Mas em meu entender alguma margem de
manobra política tem de ser criada para acolher este nível de participação. Não
é ainda também claro se Artur Mas e o governo regional em funções utilizarão os
resultados e o nível de participação como instrumento de marcação de eleições
antecipadas, em estilo plebiscitário. É provável que Mas enverede por uma
sinuosa negociação com Madrid e que só em função dos resultados dessa trégua
negocial se decida pelo ato plebiscitário. Tudo isso são conjeturas com elevada
dose de concretização possível. O que é certo é que a postura política do
governo espanhol só tenderá a engrossar o descontentamento agora validado por
este nível de participação largamente potenciado pelo envolvimento de organizações
de cidadãos. A energia participativa do catalanismo necessitará de encontrar
alguma fórmula de tradução política e a tragédia é que a rigidez de Rajoy parece
cada vez mais incapaz de proporcionar essa solução política com cobertura constitucional.
Acossado por uma corrupção endémica, pela ascensão
do PODEMOS, em parte também pela renovação de liderança do PSOE assegurada por
Pedro Sanchéz e agora pela necessidade de gerir o pós 9N, o governo PP emerge
incapaz de capitalizar alguma melhoria de situação macroeconómica interna.
É espantoso como se degradou a situação política
do PP entre a sua estrondosa vitória eleitoral e a sua agonia latente de hoje. Também
aqui se sente a aceleração dos efeitos da crise de 2007-2008 e dos seus
devastadores efeitos na banca espanhola. A evolução espanhola dos últimos 7
anos bastaria por si só para mostrar que não há gestão macroeconómica de crises
sem atender às margens de manobra possível no plano político.
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