quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

ALARGAMENTOS A LESTE

Há semanas que a austeridade e a corrupção estão sob o fogo de milhares de pessoas na Praça da Universidade em Bucareste e em outras praças de cidades romenas. Apenas novas manifestações de “indignados”? Talvez sim, se considerarmos a mescla de participantes e a diversidade de reivindicações – como referiu o sociólogo Mircea Kivu: “é, muito provavelmente, a manifestação menos homogénea a que alguma vez assisti na Roménia”. E, também, porque delas emergiu mais um herói acidental, no caso Raed Arafat, um palestiniano de Damasco que cursou Medicina em Bucareste, por lá fundou o Serviço Móvel de Urgência, Reanimação e Desencarceramento (SMURD) e foi em 2009 chamado a desempenhar o cargo de subsecretário de Estado da Saúde.
Os factos. Primeiro, cinco dias vertiginosos: a 12 de Janeiro, Raed criticava num programa televisivo a entrada de capital público em unidades de intervenção privadas e
privatização da saúde pública, o Presidente da República Traian Băsescu entra telefonicamente em direto e defende o projeto de reforma da Saúde, Raed demite-se de imediato e também em direto, despoletam-se protestos na rua, Băsescu pede a retirada do projeto e a volta de Raed, este aceita. Não obstante, o rastilho já estava aceso e os confrontos sucederam-se. Entretanto, e já esta semana, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Teodor Baconschi, é demitido por sms pelo primeiro-ministro Emil Boc quando participava, em Bruxelas, no Conselho de Ministros da UE; tinha escrito no seu blogue, a propósito dos manifestantes, serem “originários de bairros podres, pessoas violentas e estúpidas, semelhantes aos mineiros de outros tempos que apoiavam os herdeiros da Sécuritaté”!

Mas, peripécias à parte, o verdadeiramente significante está bem para além desta “espuma dos dias”. Refiro-me à evidência de um outro falhanço político e estratégico da construção europeia, aquela mesma que se proclamava desejavelmente calibrada entre processos de alargamento e de aprofundamento. É que, a somar a uma deficiente avaliação das condições concretas em presença e às consequências concorrenciais devastadoras internamente provocadas, os alargamentos da década passada – e, em especial, o último (Roménia e Bulgária) – autorizaram uma sua associação pelos cidadãos à esperança nascida em 1989 que assaca à Europa as culpas maiores por um desfazer de ilusões de progresso – “a Revolução nunca existiu” – que teria sido, afinal, perfeitamente antecipável.

Hoje, em face da conjuntura conturbada que atravessamos, o grave está na reincidência: veja-se o irresponsável patrocínio – tão bem ilustrado no “on en fera…” de Nicolas Vadot em “Le Vif/L’Express”, Bruxelas – do referendo que tornará a Croácia o 28º membro do “clube” em 2013; mesmo que, menos ingénuos, os croatas possam ter já tido o cuidado prévio de molhar os pés para sentirem a temperatura da água (como o sérvio Corax ilustrou em http://www.tportal.hr) e assim refrearem entusiasmos injustificados...

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