sábado, 14 de janeiro de 2012

A CAPTURA DO ESTADO

Fim de semana essencialmente marcado por duas crónicas, publicadas no Público de hoje, de José Pacheco Pereira e Vasco Pulido Valente, ambas marcadas pelo tema da captura do Estado e do seu poder de intervenção, desenvolvida a partir dos aparelhos partidários e com ramificação a centros de poder económico. Mais previsível a de VPV porque corresponde a uma interpretação da sociedade portuguesa que o autor tem alimentado há longo tempo, sobretudo forjada a partir de um conceito de inércia histórica e estrutural que vai buscar essencialmente à sua investigação histórica designadamente do século XIX português. Mais arrojada a de JPP porque é desenvolvida com base numa interpretação de historiador contemporâneo e de uma análise impiedosa dos aparelhos partidários, vistos como lugares privilegiados de perceção dos impasses sociais e políticos da sociedade portuguesa. Mas ambas podendo ser lidas numa perspetiva de captura do Estado. O que pesa fortemente na discussão das relações entre o público e o privado, no seu balanceamento e sobretudo na definição dos seus domínios de intervenção para fazer face aos desafios que nos estão hoje colocados.
O escrutínio e desmontagem dessa captura não é tarefa fácil. JPP introduz uma inovadora distinção entre macro e microprocessos, sustentando a tese de que a identificação destes últimos é bem mais séria e complexa, dada a sua menor visibilidade. A construção da Máfia portuguesa é uma abordagem forte, mesmo que JPP sublinhe que a designação adotada se refere mais à Máfia da Tangentopoli (investigação criminal em larga escala desenvolvida em Itália nos anos 90 centrada nas relações de corrupção e suborno nos meios administrativos, políticos e de negócios) do que à Máfia siciliana. O tema interessa-nos porque está no centro da relação público-privado e sem uma adequada compreensão das redes de poder que capturam o Estado aquele debate permanece estritamente ideológico.
Por curiosidade, na nota de imprensa de um dos mais sugestivos “think-tanks” europeus, o LEAP/E2020 Press Review on the Global Systemic Crisis, que me chegou recentemente, pode ler-se que “a Máfia constitui hoje o maior negócio de toda a Itália gerando um volume de negócios estimado em 140 milhares de milhões de euros”, sendo descrito como “o maior banco italiano do país com uma liquidez estimada em 65 milhares de milhões de euros”. Seria interessante saber em que medida o ajustamento liderado por Mário Monti integra ou não esta dimensão.

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