quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

A DERIVA EUROPEIA VISTA DA AMÉRICA


Martin Feldstein não é um economista qualquer. Professor de Economia em Harvard foi Presidente do Conselho de Assessores de Ronald Reagan e já dirigiu o National Bureau of Economic Research, prestigiada organização que gere a investigação económica nos Estados Unidos da América. Não é, como se depreende desta breve nota curricular, um economista fora do mainstream.
Mas num recente artigo publicado no Project Syndicate, uma das referências de consulta assinaladas no nosso blogue, Feldstein comenta com frieza a já aqui também comentada notícia em torno das negociações em curso em torno do acordo /tratado sobre o pacto fiscal para a zona euro. As posições alemãs, veiculadas por altos dirigentes do BCE, apontariam para só fossem permitidos subidas no défice público acima do limite de 0,5% de peso no PIB em situações de “catástrofes naturais e situações de emergência severa fora do controlo dos governos”. A sua conclusão é cristalina: “se for implementada, esta proposta determinará elevadas taxas de desemprego e nenhum caminho para a recuperação – em resumo, uma depressão. Na prática, esta política tem de ser violada, alias tal como o velho Pacto para a Estabilidade e Crescimento foi abandonado quando a França e a Alemanha desafiaram as suas regras e não sofreram quaisquer penalidades”. Cristalino, não é? E acrescenta que “não é claro o que poderá por cobro a esta espiral descendente de austeridade fiscal e de redução da atividade económica”.
Este artigo configura bem a tese avançada neste blogue que as posições mais contundentes sobre a miopia europeia têm emergido do interior do sistema e não por via de economistas desalinhados. Feldstein personifica exemplarmente o primeiro grupo de posições.
Mas não ficamos por aqui. No Business Insider de ontem, Marshall Auerback, um analista de mercado e portanto sem a força de opinião de Feldstein afirmava num artigo que recomendo: “A minha opinião é que as descidas de rating provocam um círculo vicioso nos países que acabarão por adotar políticas que colocarão as suas economias num risco ainda mais elevado do que já estão. A razão para isso é que na Europa o desequilíbrio da estrutura financeira (leia-se na minha opinião indefinição do papel do BCE) não pode ser resolvido por medidas de austeridade porque essa estrutura não é capaz de lidar com choques externos significativos na procura de bens e serviços”.
Pelos vistos, a distância que o Atlântico possibilita permite ver melhor coisas que a miopia endógena do mainstream da política económica europeia teima em não ver ou pelo menos a ver desfocadas. E não é apenas um problema de óculos …

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