domingo, 1 de janeiro de 2012

NORTE: UMA QUESTÃO NACIONAL


Antes de mais Bom Ano de 2012 a todos os que têm acompanhado este blogue, apesar das tormentas que se avizinham e da fragilidade da navegação. Saúdo também o regresso à reflexão do Freire de Sousa e com uma ode aos cafés e cafetarias da Europa. Preciosa.
Começo o ano com uma incursão pelo tema regional que, um pouco surpreendentemente, confesso, tem tido uma menor frequência de reflexão do que eu próprio imaginaria. Mas a premência da questão macroeconómica explica a situação.
Em oposição frontal a algum regionalismo bacoco tenho defendido que os problemas do Norte constituem uma questão nacional e não simplesmente regional. Os fundamentos da minha argumentação situam-se sobretudo na natureza da mudança estrutural a que a Região está sujeita, sobretudo do seu aparelho produtivo mais exposto ao exterior. Por outras palavras, no Norte projetam-se com clareza e maior intensidade os problemas nacionais de mudança do nosso modelo de crescimento: passagem de um modelo com elevada capacidade de criação de emprego desqualificado para um outro menos exuberante na criação de emprego e capaz de incorporar mais conhecimento e qualificações. Trata-se, por isso, de uma questão nacional e não simplesmente regional. O que não é indiferente em termos de mobilização de meios e de políticas públicas.
A recente publicação dos dados do 3º trimestre do Norte Conjuntura (edição CCDRN) vem confirmar em parte o sentido da minha argumentação. Destaco dois elementos de reflexão, um respeitante ao mercado de trabalho, outro relativo ao comportamento das exportações.
Trabalhando alguns números relativos ao primeiro domínio, o quadro seguinte é extremamente informativo:

 
Variáveis
3º Trim. 2009
3º Trim. 2010
3º Trim. 2011
Taxa de desemprego (%)
Portugal
9,8
10,9
12,4
Norte
11,6
13,2
12,7
Taxa de desemprego de jovens (15-24) (%)
Portugal
19,2
23,4
30,0
Norte
21,5
24,6
27,6
Taxa de desemprego de indivíduos com formação superior (%)
Portugal
7,7
7,8
9,4
Norte
8,4
9,2
10,8
Proporção de desempregados há 1 ano ou mais (%)
Portugal
46,3
55,7
51,7
Norte
49,1
55,7
51,5
Taxa de emprego (15-64) anos (%)
Portugal
65,8
65,5
64,5
Norte
64,0
63,0
63,6
Fontes: Inquérito ao Emprego, INE; Norte Conjuntura, CCDRN

A dimensão estrutural do desemprego emerge com nitidez e aproxima-se dos valores nacionais, com oscilação no desemprego de jovens e de indivíduos com formação superior. O mercado de trabalho da Região mimetiza, assim, os problemas estruturais nacionais, agora com o impacto da austeridade recessiva.
Quanto ao comportamento das exportações, o bom desempenho das indústrias tradicionais, com o calçado à cabeça, ilustra também um argumento que tenho frequentemente utilizado. Há uma capacidade de resiliência instalada, mais ao nível de empresas concretas do que em termos de sectores de atividade. A mudança estrutural opera mas lentamente. Aliás, isso é também observável no comportamento promissor do emprego na indústria transformadora (crescimento homólogo neste trimestre de 6,7%). O turismo resiste o que é uma boa notícia.
É fundamental que o mito da austeridade expansionista não aniquile precocemente esta resiliência e mudança estrutural em curso. Vozes mais críticas argumentarão que esta resiliência é limitada, pelo facto de se circunscrever aos setores de especialização mais tradicional. Porém, esta resiliência, apesar de limitada a estes setores de atividade, cumpre uma função crucial: (i) minimiza os efeitos de destruição de emprego que a mudança estrutural tenderá a intensificar; (ii) permite ganhar tempo para que as empresas de base tecnológica emergentes e o empreendedorismo associado possam consolidar-se, juntar-se ao processo em curso e começar finalmente a influenciar os dados de exportação, da produtividade e da criação de emprego mais qualificado. Não é uma função menor. Cumpre um papel crucial em todo o processo.
Finalmente, tal como vem sendo observado a nível nacional, todos os indicadores respeitantes ao setor de não transacionáveis (serviços e construção, essencialmente) começam a revelar quão penosa vai ser a desaceleração desse tipo de atividades, com a restrição de crédito a comandar o processo.

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