domingo, 29 de janeiro de 2012

DEUTSCHLAND

Li neste fim de semana uma notícia segundo a qual, apenas 67 anos passados sobre o 27 de Janeiro de 1945 (data da libertação do campo de concentração nazi de Auschwitz pelas tropas russas), uma sondagem publicada pela revista “Stern” indica que 21% (mais de um em cada cinco) dos jovens alemães entre 18 e 29 anos desconhece o significado exterminador de Auschwitz (10% para o conjunto da população). E que quase dois terços do povo germânico considera não ter responsabilidade particular em relação a outros povos pelos crimes nazis. Dados a que o presidente do “Bundestag” somou os resultantes de um estudo independente sublinhando que 20% da população revela um “antissemitismo latente”.

Confrontado com este panorama, veio-me à cabeça a ideia de sugerir aos nossos parceiros e amigos alemães que, em lugar de polemizarem cinicamente sobre “o livro ilegível” (“Mein Kampf”, 1924) e a (não) exigência de que ele caia no domínio público (2015), promoverem a divulgação e leitura de uma obra que seguramente não deixará de os ajudar a contextualizar. Trata-se de “As Benevolentes”, um perturbador e magnífico romance épico do norte-americano Jonathan Littell e que, embora inicialmente escrito em francês (Prémio Goncourt 2006), está disponível em tradução para a língua nativa de Merkel.

Não será, a meu ver, muito relevante discutir a justeza da aproximação que alguns fizeram a este livro como o “Guerra e Paz” deste século (ou do século XX se nos reportarmos ao tempo histórico de uma narrativa que coincide com a segunda guerra mundial) mas antes, e sobretudo, sublinhar a sua força intrínseca – tortura e barbárie, miséria e baixeza, desumanidade e horror, sexo e repulsa, erotismo e incesto, intimismo e desespero, descrição e culpa, crueza e confissão, em suma, uma reflexão quase “arendtiana” em torno do mal.

Tal surge desde logo claro no postulado de abertura de Maximilien Aue, o ex-oficial nazi que relata em jeito de memórias o seu testemunho e participação em execuções de judeus, organização de campos de concentração, batalhas na frente russa e vivências numa Berlim à beira da derrota: “Os que me leem nunca poderão dizer: Não matarei, é impossível; poderão dizer quando muito: Espero não matar.” Ou, de outro modo: “Penso que me é permitido concluir
como um facto estabelecido pela história moderna que toda a gente, ou quase, num conjunto de circunstâncias dadas, faz o que se lhe diz que faça: e, peço, desculpa, há poucas probabilidades de ser o leitor a exceção, tal como eu não a fui.”

Magistral e obrigatório!

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