sábado, 12 de janeiro de 2013

GRAU ZERO



A margem de manobra do Governo para suscitar uma ampla e serena discussão sobre o peso do Estado em Portugal esgota-se a uma velocidade proporcional à inépcia da governação.
A encenação criada com a comunicação do estudo do FMI lida em simultâneo com a trapalhada da desautorização da concertação social quanto à matéria das indemnizações por despedimento constitui uma espécie de representação do grau zero da margem de manobra que lhe resta. De acordo com o registo do Expresso de hoje, a matéria das indemnizações estará a ser objeto de uma discussão à margem do Governo entre a UGT, a Comissão Europeia (Durão Barroso) e FMI (Madame Lagarde) no sentido de garantir uma solução que evite a interrupção (mais do que justificada pela inépcia governamental) da concertação social em torno destas matérias. Haverá melhor indicador de que o Governo não governa de facto? Tudo indica que a mudança do Executivo (imposta por uma consulta eleitoral ou concebida in extremis a partir da atual maioria) tende a emergir como uma condição de êxito do próprio acordo ou memorando.
Por outro lado, o dossier dos cortes dos 4.000 milhões de euros na despesa pública anunciava por si só muita lenha para a fogueira mas o modelo escolhido para a sua divulgação pode ter transformado uma simples fogueira num fogo incontrolável. Com esta encenação, o Governo transforma uma matéria de discussão obrigatória na sociedade portuguesa (o papel e não apenas o peso do Estado) em fator de divisão irreversível dos Portugueses e de barganha política tout court, sendo ambas as consequências incompatíveis com uma abordagem sensata ao problema.
Aliás, colocar no mesmo saco o processo de consolidação orçamental e a discussão estrutural do papel e do peso do Estado para um novo ciclo de desejado crescimento da economia portuguesa no momento atual de fracasso em que as terapias da austeridade se encontram e sem escrutínio eleitoral afastará do processo os mais esclarecidos. O Governo não evidencia ter ideias claras sobre o futuro (fins) para o qual pretende redimensionar os meios de intervenção do Estado. De toda esta confusão, ressalta a evidência de que o corte dos 4.000 milhões pelo qual o Governo se bate, mais do que um projeto de revisão da dimensão do Estado que a maioria pode submeter a escrutínio eleitoral, é antes uma medida de aflição para colmatar o fracasso da sua própria estratégia de consolidação orçamental. Com esta inépcia e incapacidade de arrepiar caminho, o Governo está a colocar-nos num lio cujo desatar se afigura de grande complexidade. E tudo isto sem sequer entrar em linha de conta com eventuais inconstitucionalidades do OGE 2013.

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