terça-feira, 8 de janeiro de 2013

OS ECONOMISTAS E A CRISE



(Olivier Blanchard)
Há dias, na sua coluna regular no New York Times, Krugman dava conta da sua participação na grande e esmagadora Conferência da American Economic Association, a Meca do pensamento económico por muito que os economistas europeus lhes custe reconhecer essa superioridade.
Nessa Conferência, o artigo de Olivier Blanchard (economista-chefe do FMI) e Daniel Leigh (Growth Forecast Errors and Fiscal Multipliers, publicado também como Working Paper da instituição – WP/13/1), representou o foco de todos os debates e atenções. Nesse trabalho, Blanchard e Leigh transportam para o debate científico inter-pares os resultados do mea culpa do FMI originalmente apresentado como caixa do World Economic Outlook e largamente badalado nas inúmeras entrevistas que Madame Lagarde concedeu a propósito da Conferência Anual do FMI. Voltarei nos próximos dias a esse artigo. Por agora, fico-me na constatação de que entre a nata dos economistas americanos a questão central de hoje é explicar por que razão a recessão internacional iniciada em 2008 se tem alongado para além do que o mainstream na profissão admitiria. As derivas do “austericídio”, para retomar aqui a contundência da expressão de Felipe Gonzalez, correspondem hoje a uma simples teimosia de uma corrente de opinião. O artigo de Blanchard e Leigh coloca-se do lado de lá da barreira e não estamos a falar de economistas que projetem apenas a sua opinião para os lados da não governação. Ou seja, não são economistas endeusados pela malta do Bloco. Não! Que diabo Blanchard é tão só o economista-chefe do FMI. Conhece bem a economia portuguesa e foi dos primeiros a salientar que nem sequer nos períodos de desaceleração dos salários nominais em Portugal o custo unitário em trabalho desceu. Sabemos que nem sempre as instituições seguem as pisadas do seu economista-chefe. Mas, neste caso, é a própria instituição que invoca a pesquisa do seu economista-chefe para assumir o mea culpa.
Resumindo, os pares americanos debatem, comprometem-se, intervêm. Por cá, dois grupos destacam-se pelo seu posicionamento de estratosfera. Os mais velhos e influentes deixaram há muito de publicar, escrever uma linha é uma chatice, vão orientando alguns doutoramentos, vão dando uns bitaites para Mário Crespo ver e custa-lhes a alma recuar na sua fúria de austeridade a todo o preço. Saíram-lhes pela culatra as posições tão precocemente assumidas ainda o memorando estava cheio de pesporrência. Os mais novos, entre os quais alguns candidatos a jovens turcos vão ganhando posições, publicam, publicam sem fim mas o seu contacto com as evidências da crise não é compatível com a sua propensão para fazer investigação em ambientes bacteriologicamente puros. Aliás, acho que os seus gabinetes de investigação deveriam ser absolutamente puros e aséticos. Recomendo que passem a usar fatos de astronauta ou similares, que garantam aos incautos investigadores o respeito por ambientes perfeitamente aséticos. Tornar-se-iam infelizes ao menor contacto com a realidade impura.
Subjacente a toda esta matéria, está um tema apaixonante: a explicação consistente das condições que tornam possível que um dado pensamento de teoria económica penetre a decisão e o mainstreaming da política económica ou que, pelo contrário, esteja condenado a não marcar essa mesma política económica.
Hoje, pela Amazon, chegou-me às mãos a obra de Sylvia Nasar, Grand Pursuit – the story of the people who made modern economics. Talvez ela ilumine essa questão crucial dos tempos atuais.

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