quinta-feira, 21 de agosto de 2014

MIN(MAX)UDÊNCIAS EUROPEIAS



Perdoem-me a inventiva linguística mas foi a contra-expressão que me veio ao teclado para descrever o que se vai passando por esta Europa desconcertada. E já não falo no apagamento da diplomacia (inexistente). Concentro-me apenas na evolução da situação económica e na confrangedora apatia ou inépcia das autoridades europeias para a contrabalançar.
Crescem em número e em intensidade as vozes dos que alertam para a necessidade de alargar o critério base para a datação de recessões (dois trimestres consecutivos de queda do PIB) para compreender a debilidade da recuperação económica europeia. Talvez a queda do PIB alemão no último trimestre seja um facto passageiro, mas dizem as referidas vozes que a combinação de perspetivas deflacionárias com estancamento de produção nas economias que deveriam ser motoras da recuperação europeia não pode ser subvalorizada como uma minudência que a realidade incontornável do ciclo económico haverá de contrabalançar. Em cerimónia que envolveu um número considerável de economistas Nobel, a acontecer no pleno motor da União Europeia, a Alemanha, Stiglitz não teve papas na língua ao alertar para que a Europa corre o risco sério de “japanização”, que a acontecer certamente induzirá finalmente muitos macroeconomistas europeus a rever os seus cursos de macroeconomia e mais do que isso a rever as orientações de política económica que têm vindo a professar.

O coração macro da Comissão Europeia continua a olhar para os sinais de recuperação como de sinais divinos se tratasse, revendo sistematicamente as suas previsões esperando que os deuses por fim se manifestem.
O BCE dá a impressão de que tem forçosamente que descansar sempre que faz um esforço de intervenção e gerir os complexos equilíbrios que internamente tem de gerir para se chegar à frente. Fê-lo em junho, como aqui o assinalámos, não cedeu ao “quantitative easing” em que outros bancos centrais estiveram mergulhados e aguarda agora os pretensos efeitos sobre a economia real europeia dos meios de liquidez que proporcionou à banca europeia. À socapa, o BCE talvez espere que o FED – USA e o Bank of England comecem a frenar o apoio monetário à economia e subam taxas de juro para daí esperar alguma desvalorização do euro e com isso ganhar algum fôlego.
Mas, ironia da história, o BCE talvez não esperasse que à frente do FED estivesse uma mulher de sólida formação macroeconómica e monetária e que já deu mostra suficiente de que não restringirá artificialmente a economia americana enquanto toda a bateria de indicadores utilizados para monitorizar os objetivos de estabilidade dos preços e de desemprego tolerável não evidenciar claramente a sustentabilidade da recuperação e da pressão sobre os salários e preços. Será, por isso, crucial acompanhar amanhã as intervenções de Janet Yellen e de Mario Draghi no Kansas City Fed’s symposium, Jackson Hole, Wyoming, uma espécie de grande reunião dos banqueiros centrais.
O que para alguns são minudências inventadas por intervencionistas inveterados deveria ser melhor tido em conta pelas autoridades europeias. Elas continuam a olhar para o pós ou quase-resgate das economias do sul como se a situação macroeconómica global europeia que as enquadra continuasse no melhor dos mundos, não compreendendo que afinal se enganaram e redondamente.
Entretanto, pelas bandas de cá, o peso da dívida pública no PIB continua ladino a aumentar (134%) e os valores para a dívida privada tornam este valor uma brincadeira. Alguns analistas (André Macedo, por exemplo) refere que a situação não é preocupante, pois os recentes aumentos têm servido para reforçar as almofadas para os imprevistos da saída limpa. E, quase por encanto, já ninguém fala no fatídico limiar dos 90% de peso da dívida pública que muitos utilizaram para nos vender a via punitiva da salvação. É por estas e por outras que o sentido crítico não pode baixar a guarda.

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