Sérgio Sousa Pinto (SSP) estava em grande forma no último “Lei da Bolha”. Talvez galvanizado pela presença do jovem convidado Duarte Alves (um esforçado mas excessivamente fechado deputado do PCP), SSP disse e bem de sua justiça quanto à falta de crescimento económico enquanto maior problema atual de Portugal, quanto aos finitos paliativos que são os fundos europeus e o endividamento e quanto à obstinada insistência no erro que tem caraterizado as políticas governativas desde há décadas. Para devido registo, nada como citar em discurso direto e com a devida vénia.
“A questão essencial é saber se um Orçamento apoiado pelo PCP, e talvez pelo Bloco de Esquerda, com todos os compromissos e cedências a que esse Orçamento vai supostamente obrigar, é ou não um Orçamento que trate do grande problema nacional. E o grande problema nacional chama-se crescimento económico — o problema nacional, o que é de difícil resolução, o que é teimoso, obstinado, trabalhoso é a ausência de crescimento. Nós não temos um crescimento significativo, temos um crescimento medíocre desde os primeiros anos da adesão — nos anos imediatamente subsequentes à adesão, tivemos um crescimento económico que tem a ver com um fenómeno de que já falamos aqui neste programa, chamado rattrapage, no princípio há de facto um crescimento económico assinalável e depois parou. E, portanto, nós temos divergido em relação à média europeia, com ligeiras recuperações, mas a verdade é que nós não conseguimos resolver o problema nacional e às vezes não queremos reconhecê-lo — o primeiro passo para resolvermos o problema do crescimento é reconhecer que o grande problema português é o crescimento económico.”
“A questão que se coloca é: ao fim de mais de vinte anos de um crescimento débil e medíocre, nós devemos interrogar-nos. Então o nosso modelo, chamemos-lhe assim, de economia sem crescimento é um modelo viável? Eu acho que este modelo não é viável. Porque é um modelo que tem sido artificialmente viabilizado, mantido, sustentado com uma enorme injeção de fundos comunitários (que vão certamente acabar, e mesmo que não acabassem isto não é modo de vida para um país soberano), por um lado, e por aquilo a que os economistas chamam as políticas acomodatícias do Banco Central Europeu que nos permitem financiar o nosso endividamento, por outro lado. Portanto, nós vivemos de endividamento, nós vivemos de transferências que vêm da União Europeia, nós não crescemos, ou seja, não estamos a ser capazes de produzir riqueza como seria desejável para respondermos às expectativas legítimas da nossa comunidade nacional. E quais são elas? Não são só essas questões, muito importantes é certo, dos passes e dos layoffs, não, é as pessoas poderem ter acesso a um Sistema Nacional de Saúde como deve ser, terem acesso a uma educação como deve ser, terem acesso a níveis de fiscalidade aceitáveis (e não o esmagamento a que boa parte dos contribuintes portugueses estão hoje submetidos), a possibilidade de terem uma vida mais confortável e sem terem propostas de aumento de salários de 0,9% (porque o quadro macroeconómico não consente mais segundo o Governo); nós temos de perceber que estamos prisioneiros da nossa gaiola de mediocridade económica, pronto não há! (...) Portanto, ao não crescermos, nós estamos num processo de empobrecimento; por causa do problema demográfico, que vai tornar a pressão sobre as pensões intolerável e que vai obrigar forçosamente a um aumento de impostos; só que nós já estamos num sistema distributivo dos remediados para os pobres — isto não é viável, mais cedo ou mais tarde os governos do futuro — e quando estamos a falar destes problemas estruturais nacionais, não estamos a falar do governo do PS, estamos a falar dos governos do PS e dos governos anteriores, do PSD (...). Há uma espécie de conformismo nacional, de resignação a este desempenho económico. Há pessoas que estão obstinadas no erro e nas políticas erradas; quando uma coisa não funciona e se faz igual... Eu acho que é o caso do PS e do PSD, que levam décadas de governação, e que em vinte anos não aprenderam que este modelo, assim como não está, não é viável mais cedo ou mais tarde. Não é viável para a geração mais nova (...). Tanto assim que hoje em dia a classe média tem hoje como plano B exportar os seus filhos para o exterior — mão-de-obra qualificada que sai das faculdades para ganhar 700 euros por mês, logo não fica cá, como é evidente.”
“Os economistas são ótimos a fazer o diagnóstico, são mais cuidadosos quando se trata de apontar caminhos. Uns dizem que o problema está na baixa qualificação dos portugueses — quer dizer, nós estamos a exportar mão-de-obra qualificada que não consegue ser absorvida pela oferta portuguesa porque os salários são baixíssimos; bom, temos um problema de qualificação. Temos um problema de que não há investimento direto estrangeiro — falavas, com razão, da necessidade de transferências tecnológicas, melhor gestão... ora, o último investimento relevante foi a AutoEuropa, foi em 1991, tinha eu 15 anos e já tenho 49! Outros dizem que o problema é que não há poupança: não há poupança, o País não tem capitais, as pessoas queixam-se de que não têm incentivo à poupança... e é evidente que a carga fiscal não ajuda a poupança. Nós temos problemas que, sem entrar nas grandes explicações para que não me sinto qualificado nem me atreveria a entrar num diálogo com os economistas, é evidente que têm de ser enfrentados: para termos um País que produza mais riqueza, que permita melhores salários — um quarto dos portugueses que trabalham recebem o salário mínimo nacional, o salário médio não sobe e qualquer dia o salário mínimo está encostado ao salário médio, como é que isto não gera interrogações sobre o nosso modelo económico! (...) Quando não há dinheiro nem há capacidade de endividamento — porque o País está num rácio de dívida de 130% do PIB e esta solução do endividamento (que nem o Governo quer e, por isso, tem feito um esforço de controlo do défice porque sabe que o endividamento acabou como expediente para os problemas nacionais cuja solução vai retardando) —, o que nós temos de pensar é como é que se liberta a economia. E tem de libertar mexendo em muitas coisas: mexendo na carga fiscal, mexendo no esforço fiscal que incide sobre as famílias e sobre as empresas, mexendo nos encargos na contratação (que heróis em Portugal é que fazem contratos de trabalho sem termo, que estão felizmente a aumentar mas são caríssimos, um esforço enorme para as empresas)... Se nós queremos crescimento, salários e uma vida decente para as pessoas, para os trabalhadores, em vez de lhes atirarmos com subsídios e rendimentos mínimos — que são prisões de pobreza de que ninguém consegue libertar-se — é preciso é criar um certo dinamismo económico, este é o único caminho, é o caminho do crescimento.”
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