Enquanto decorre na Assembleia da República o debate do “Estado da Nação”, cada vez mais um momento de jogos florais com escasso conteúdo e rigor por parte dos principais protagonistas (António Costa incluído, apesar de ser aquele de quem mais se esperaria uma responsabilização em sede de seriedade, competência e foco), dou por mim a pensar no que está por detrás de toda aquela quase inaudível encenação (em que, citando Pedro Adão e Silva, “os deputados [e os governantes, acrescente-se] são uma espécie de procuradores do cinema americano de série B”).
E, sendo por uma vez ingénuo na análise, cá me decido a conceder que a diferença entre o que uns e outros veem pode de algum modo também provir (pelo menos parcialmente e para lá das agendas político-partidárias e pessoais dominantes em cada caso) de leituras muito próprias e diversas do que cabe ou deve caber à ação governativa ― dou um exemplo, com aplicação ao primeiro-ministro: tendo a achar mesmo que Costa, independentemente da sua vaidade política própria e das suas ambições europeias, acha mesmo que o papel que lhe cabe é mais ou menos aquele que tem desempenhado, o de uma espécie de árbitro entre ministros setoriais com dirigismo seletivo estritamente aplicado a situações que considere de implicações diferenciadoras, por um lado, e o de uma espécie de agenciador junto dos principais stakeholders do País no sentido de ir procurando aplicar os muitos milhares de milhões europeus que lhe caíram no colo para ajudar a resolver ao dia problemas de toda a ordem sem grandes preocupações de ordenação estratégica e de assim pensar o médio prazo, por outro.
Se eu tiver alguma razão em tal pressuposto, a resultante é a de que estes debates são mesmo completamente infrutíferos e improcedentes. Ou, melhor dito, praticamente apenas retóricos. Nesta conformidade, acaba por ser a comunicação social ― a boa, claro e cada vez mais rara ― a melhor poder balancear as coisas na perspetiva de uma avaliação adequada do dito Estado da Nação. Remeto, por isso, para o “Público” de hoje e, em especial, para a peça assinada pelo seu ex-diretor Manuel Carvalho (“O país ansioso que vive no Estado das contas certas”), aqui apenas deixando indicativamente referenciados, à guisa de complementos temáticos de pendor positivo e/ou negativo, os seus subtítulos (que não devem, contudo, substituir a leitura completa). Um trabalho notável e um esforçado e capaz compromisso entre a propaganda do Governo e o derrotismo das Oposições.
Para terminar, uma nota sobre a sondagem que o “Público” divulga neste mesmo dia. Com dois particulares recados em direção ao “autismo” do primeiro-ministro: o de mais de 50% dos inquiridos considerar que o Governo tem sido mau ou muito mau e o de mais de três quartos e 76% dos inquiridos considerarem, respetivamente, que deve haver uma remodelação governamental e que Costa não fez bem em manter Galamba aquando da sua prestação na CPI da TAP. Depois, há ainda outras informações relevantes, como as de que os portugueses não defendem eleições antecipadas (mais por razões de descrença na democracia que temos e na correspondente inexistência de soluções do que por razões verdadeiramente fundamentadas e sentidas, digo eu), mas a exploração dessas questões já nos levaria para fora do tema hoje em apreço.
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