quinta-feira, 6 de julho de 2023

PEDRO E ALEXANDRA E NÃO ESQUEÇAM O JOSÉ LUÍS …

 


(Ainda com alguns apetrechos médicos transformados em apêndices de circunstância de um corpo que procura regressar à normalidade, a neblina que paira sobre o litoral de Matosinhos e que se avista das amplas janelas do CUF inspira-me a distração de um post. E, por falar em neblina, ela serve de metáfora para a espuma política destes dias. O relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito da TAP parece ter-se esfumado no nevoeiro político destes dias, transformado em mero jogo político depois da comunicação social ter saciado toda a sede de estardalhaço e estar já à procura de uma outra, pois isto da “silly season” já não é o que era. Mas também a partir de um outro nevoeiro, o da retirada estratégica parcial, Pedro Nuno Santos regressa ao Parlamento como se nada tivesse acontecido, em direção à sua “boa imprensa”, que sempre gostou de bravatas. E assim aproveito para falar de quem vai ser o Sebastião do PS depois de Costa, não esquecendo entretanto que a historiografia moderna, tal como o Professor Vítor Teixeira o tem relembrado, a derrota de D. Sebastião não pode, apesar disso, ser dissociada da contenção que o desventurado jovem monarca português conseguiu realizar da pressão otomana.)

Não devemos ignorar que a sucessão de Costa, que tudo indica que não será precipitada e acontecerá no tempo anunciado, vai concretizar-se num momento eleitoral que não será pera doce para o PS. Por mais que o desconchavo interno do PSD persista no seu dia a dia e na cada vez mais enigmática relação entre Montenegro, líder parlamentar Sarmento, deputados e bases, o tempo político vai ser favorável à alternância, a não ser que as Europeia ofereçam ao PS um daqueles fôlegos que a história eleitoral por vezes nos oferece. Nesse contexto de tensão, o Sebastião do PS não pode ser de falas brandas.

Antecipando esse cenário, penso que há dois candidatos à sucessão de Costa que já perdem antes de começar – Fernando Medina e Ana Catarina Mendes. Isto não significa de modo algum desvalorizar a sua obra governativa. Podemos zurzir no conservadorismo fiscal de Medina e estar descontentes com o seu modo de utilização das folgas orçamentais, mas não podemos ignorar que a passagem de Medina pelo Ministério permitiu que as condições orçamentais nunca estivessem ao rubro e que o peso do endividamento público abrandasse. E Ana Catarina Mendes, embora por natureza pouco expressiva e pouco capaz de grandes arrebatamentos, não pode ser dissociada de uma governação corajosa em matéria de valores, sobretudo os da imigração. Tudo isso é verdade mas não me parece que Medina e Catarina Mendes tenham estaleca emocional para enfrentar a tensão da sucessão, tal como eu a antecipo, com uma refrega eleitoral de grandes proporções a dominar o ambiente.

Esta semana, regressado de um nevoeiro imposto, apenas interrompido por dois aparecimentos na Comissão de Inquérito desenhados à medida do regresso, Pedro Nuno Santos regressou em grande estilo ao Parlamento, como se nada tivesse acontecido. O homem tem fibra, disso não tenho dúvidas, e é impressionante o modo como a sua “boa imprensa” o recebeu, sobretudo depois de todas as contrariedades, humilhação política e contradições de discurso e de prática em que o assunto TAP é pródigo. São características relevantes para o contexto de tensão em que a sucessão irá ser observada, o ex-Ministro e agora deputado na última fila sabe-o bem, mas há qualquer coisa que não consigo plenamente racionalizar que me diz que não apostaria em PNS e que se fosse militante de cartão no momento certo nele não votaria. Mas isto não significa obviamente retirá-lo do meu radar e não se sabe até que ponto o contexto político poderá ou não radicalizar-se, impondo novos perfis de liderança.

Por isso, nesta mesma área da esquerda do PS e sobretudo na área da não resignação política, continuo a pensar que Alexandra Leitão seria uma excelente candidata a uma lufada de ar fresco na política socialista e portuguesa em geral, claramente ao nível de outras lideranças femininas na Europa e fora dela e que tiveram passagens fulgurantes pela política. Não faço a mínima ideia se a Alexandra quer ou não ascender a esse plano de liderança. Estou simplesmente a analisar o contexto político atual e as figuras que nele se evidenciam e a projetá-lo para um contexto futuro de necessariamente mais tensão, com as correspondentes implicações no discurso político e eleitoral.

Claro que o leitor arguto que pensa que dificilmente a esquerda do PS poderá ganhar uma eleição nacional em que se define o futuro do país retorquirá, não menos argutamente, que as minhas reservas a PNS se deverão colocar também a Alexandra Leitão.

É, por isso, que nas minhas suposições políticas não coloco de fora um outro personagem político com uma prestação governativa sóbria, discreta, mas muito eficaz, o ministro José Luís Carneiro. Vindo das hostes de António José Seguro, a trajetória de JLC tem sido exemplar, embora sempre sujeito a que um verão de incêndios mais escaldantes precipite uma má sorte política, que até agora não aconteceu.

Depois de ter arrumado as ideias, mesmo sem que a bruma litoral de Matosinhos se tenha dissipado, fico com a impressão que a sucessão de António Costa irá proporcionar à política portuguesa um raro momento de clarificação de ideias de governação. O que muito sinceramente acho que nem o próprio António Costa se tenha apercebido da importância que ela vai ter.

 

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