domingo, 20 de maio de 2012

FLEXIBILIDADE … MAS SEM SEGURANÇA

(Página 138 do Relatório do Banco de Portugal sobre a Economia Portuguesa em 2011)

O JN de hoje (página 28 da edição impressa) dedica especial atenção a uma dimensão do recente relatório do Banco de Portugal sobre a economia portuguesa no ano de 2011, mais propriamente sobre a flexibilidade do mercado de trabalho em Portugal.
Este tema é recorrente, pois a pretensa rigidez do mercado de trabalho em Portugal é recorrentemente invocada como o principal motivo de liberalização da legislação laboral. Já aqui repetidas vezes foi aqui focada a ligeireza desta tese, não falando já na profunda insensibilidade que é martelar a liberalização laboral num contexto depressivo como aquele em que a maioria das famílias portuguesas se encontra.
Durante largo tempo, a flexibilidade do mercado de trabalho foi assegurada por via do processo de criação e destruição de empresas, sobretudo nas regiões do território nacional em que a criação de empresas e o seu encerramento não constitui nenhum “bicho-de-sete-cabeças” para a dotação empresarial existente. Essa via tem vindo rapidamente a esgotar-se.
O estudo do Banco de Portugal a que o JN alude compara e bem a rigidez implícita na elevada percentagem de desemprego de longa duração no desempego total que a economia portuguesa apresenta com o indicador das transições de “emprego para não-emprego” e situação inversa (ver gráfico que abre este post). E sob este novo dado do Inquérito ao Emprego (com mudança do processo de inquirição), a posição portuguesa é bem mais favorável. Aliás, no período 2001-2011, por cada emprego criado a economia registou duas contratações. Como é óbvio, não podemos dissociar esta forma de flexibilidade de uma tendência estrutural para o peso crescente dos contratos a termo e para o fenómeno dos “falsos” recibos verdes” que aconselham a moderar os que vêm Portugal como campeão do empreendedorismo do trabalho por conta própria.
Como é óbvio persiste a não explicação da contradição existente entre os dados das transições no mercado de trabalho (ver gráfico acima) com o desemprego de longa duração. Ora, aqui, a explicação para valores tão elevados do desemprego de longa duração tem de ser encontrada em dimensões que não se prendem necessariamente com a flexibilidade/rigidez do mercado de trabalho. Pelo contrário, a sua explicação prende-se mais com a longa e penosa mutação do sistema produtivo português, onde é profundamente discutível a possibilidade de desempregados provenientes do setor não transacionável (por exemplo construção civil) e em determinados escalões etários (acima dos 50 anos, por exemplo) encontrarem rapidamente alternativa de emprego. Neste caso, não é a flexibilidade/rigidez que está em causa. O que está em causa é o realismo desses desempregados num processo individual de “job-search” terem qualificações e competências para procurar uma alternativa de regresso ativo ao mercado de trabalho. Nestas situações, são as políticas públicas de formação e de focagem continuada nos desempregados de longa duração que deve substituir-se à pretensa flexibilidade do mercado.
Resumindo, o discurso da rigidez do mercado de trabalho é ligeiro e pouco sustentado. O JN dá a justa e devida referência ao ex-ministro Vieira da Silva, um dos primeiros (honra lhe seja feita) a encontrar entre o Inquérito ao Emprego INE e os dados da Segurança Social contradições. Vieira da Silva sempre identificou nos dados da Segurança Social uma maior dinâmica de contratação e separação do que a revelada pelo INE.
Entretanto, do atual Secretário de Estado Pedro Martins, um verdadeiro ministro do Trabalho face à estrutura do Ministério da Economia, nem uma palavra se ouve. Estou curioso para ver o seu regresso ao seu blogue A Economia das Pessoas e escutar reflexão de experiência feita.

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