terça-feira, 4 de dezembro de 2012

ATÉ JÁ?

 
Além do cinismo profundo que revelam, além do caótico estado a que chegou a Europa que evidenciam e além do ofensivo paternalismo com que nos brindam, o que querem verdadeiramente dizer as declarações dos ministros das Finanças alemão e francês, ontem no Eurogrupo?
 
Porque tais declarações são tanto menos para rir quanto ocorrem na direta sequência das seguintes três outras:

·         as do presidente Jean-Claude Juncker, que aqui comentei em post de 27 de novembro (“A Grécia e o nosso amigo Juncker”);
 
·         as do ministro das Finanças na Assembleia da República, no mesmo dia 27, encerrando a discussão do OE para 2013: “Portugal e a Irlanda, países de programa, serão – de acordo com o princípio da igualdade de tratamento adotado na Cimeira da Área do Euro em julho de 2011 – beneficiados pelas condições abertas no quadro do Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira”;
 
·         as do primeiro-ministro em entrevista à TVI no dia 28: “Está adquirido, desde o Conselho Europeu de julho de 2011 – de resto por uma iniciativa minha que foi secundada pelo primeiro-ministro irlandês –, que tudo o que vigorar em qualquer dos programas de ajustamento deve ter uma regra de igualdade de tratamento nos restantes.”
 
Deixo de lado o provinciano “iniciativa minha” de Passos e o imperialista “nem a Irlanda nem Portugal me apresentaram essa ideia” de Schauble. E foco-me apenas no que de estratégia europeia primária subjaz àquelas declarações: (i) um isolamento da Grécia mal comportada (“um caso muito específico”) e um correspondente enaltecimento da atitude dos bem comportados meninos Pedro e Vítor; (ii) um rebuçado com que se espera poder recompensar estes, após as eleições alemãs de setembro de 2013, proporcionando-lhes a ficcionada “vitória” de um retumbante regresso aos mercados.
 

Detalhemos um pouco mais a coisa. O que estará verdadeiramente em causa será empurrar a economia portuguesa para uma situação que leve os credores do País a acreditarem na sua capacidade para pagar a dívida que sobre ele incumbe. E tal situação pressupõe, segundo a vulgata que os rege, a contração da economia para um nível tão baixo quanto possível (“empobrecimento”) como forma de assim se gerar o excedente externo que constitui o melhor garante de um continuado e futuro cumprimento por parte dos portugueses. Ou seja, far-se-á o máximo que se puder sobre o défice público e as restantes variáveis nominais – sem grandes preocupações quanto ao acerto das previsões, como Gaspar entretanto já anunciou –, mas será o excedente externo que passará a funcionar como a real prioridade a Sul (ver abaixo um elucidativo gráfico do “Financial Times”).
 
 
Só que a verdadeira coisa não se afigura assim tão simples. Porque, como dizem quase todos os políticos, há pessoas além dos números. E o que a Grécia estará a ilustrar de mais relevante tem muito a ver com o facto de o axiomático equilíbrio em baixa não parecer exequível, sobretudo na medida em que não resulta em algo de socialmente suportável para os cidadãos, as famílias e as empresas. Constatada esta impraticabilidade, resta isolar os malfeitores e deles receber o que puder ser recebido (“perdão da dívida”).
 
Acontece que, ao contrário do que se pretende e procura fazer crer, as dimensões social e política ganham uma expressão crescentemente incontrolável em Portugal e tornam a irrepetibilidade grega cada vez menos provável. Portugal segue a passos largos a trajetória grega – o seu passado recente foi o passado da Grécia, o seu presente é a Grécia de 2011 e o seu futuro próximo poderá ser a Grécia de 2012. O que equivale, citando uma das recentes crónicas de Daniel Deusdado no JN, a um tristérrimo “até já”…

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