(À margem da ironia da inscrição na parede e da localização algo estranha do caixote do lixo)
O Jornal de Negócios
da passada quinta feira (6 de Dezembro) publicou uma notícia-reportagem do jornalista
António Larguesa que passou despercebida na voracidade com que a informação
económica se perde no contexto atual das desventuras da economia portuguesa.
O tema nuclear da notícia
é o confronto entre o potencial de colocação de desempregados evidenciado pelas
empresas privadas de emprego e o dos serviços públicos de emprego tutelados pelo
Instituto de Emprego e Formação Profissional. Os números apresentados têm de
ser interpretados com alguma cautela, mas merecem atenção e comentário. Os números
oficiais de colocações realizadas pelos serviços do IEFP são de 60.135 colocações
realizadas em 2011, das quais a maioria é de contratos temporários (46.154). Em
contrapartida, os números avançados pela associação das empresas do setor
privado de emprego (APESPE) apontam para cerca de 280.000 cedências por parte
das agências de trabalho temporário correspondentes a cerca de 160.000 pessoas.
Refira-se entretanto que os próprios serviços públicos de emprego respondem frequentemente
a pedidos realizados pelas empresas de trabalho temporário, não sendo possível
medir que percentagem das 60.135 colocações asseguradas pelos serviços públicos
de emprego foi concretizada a partir da resposta a pedidos das empresas de
trabalho temporário.
Não há informação
fidedigna que permita testar se o valor de cedências de trabalho temporário
corresponde de facto ao número assinalado pela associação do setor. Para além
dessa impossibilidade, que por si só aconselha cautela na manipulação da
comparação realizada, em teoria os serviços públicos de emprego deveriam
protagonizar uma estratégia de ativação de desempregados mais ampla e exigente
do que uma simples empresa de trabalho temporário. O processo de ativação de desemprego
é um complexo processo de matching
entre o que deveria ser um balanço de competências do desempregado (qualificações
formais e competências acumuladas ao longo de uma trajetória de presença no mercado
de trabalho) e as competências procuradas pelo potencial empregador. Simplesmente,
em contextos de explosão do desemprego e de aumento significativo da dimensão
estrutural desse desemprego, o que acontece é que os serviços públicos de
emprego são sujeitos a uma procura massiva, alterando radicalmente a relação “desempregados/técnicos
de emprego) e transformando não raras vezes a ativação num processo meramente
burocrático que é a negação da complexidade de um “matching”. Acresce que, com a ofensiva em curso dirigida aos
serviços da administração pública, com novos recrutamentos suspensos, redução
substancial da dotação orçamental para as medidas de emprego e formação, cortes
salariais atingindo as condições de vida dos técnicos de emprego, a comparação
com as agências de trabalho temporário é de baixo nível e viciada.
Isto não significa que
a existência de entidades privadas de colocação de desempregados não possa ser
considerada uma possibilidade para melhorar as condições de ativação e colocação
de desempregados. Mas fazê-lo na base de comparações desta natureza faz lembrar
os rocambolescos casos de degradação forçada e voluntária de serviços públicos para
criar condições para a sua privatização.
Isto também não
implica que se ignore a necessidade de uma profunda revisão dos serviços públicos
de emprego, adaptando as suas metodologias de ativação e colocação de
desempregados ao contexto do crescimento de desemprego estrutural. Posso
adiantar que o IEFP tem suspensa a contratualização de um trabalho (já decidido
em sede de concurso público amplamente participado, com 22 empresas
concorrentes), no qual eu próprio participaria, de avaliação da satisfação dos
utentes dos centros de emprego (presenciais e internet) que conduziria a
propostas e recomendações concretas de reorganização dos serviços. Suspensa
essa contratualização, provavelmente num monte qualquer de autorizações do
Ministério das Finanças, estamos perante mais um indicador da insensibilidade à
melhoria dos serviços públicos que a governação atual tem revelado, quando essa
melhoria era estritamente necessária para melhorar a eficácia e eficiência dos
fundos públicos para a ativação de desempregados. E a experiência de processos
similares sugere que se assiste à degradação do serviço para depois justificar
a sua substituição por um serviço privado que, uns tempos mais tarde, iremos confirmar
não ter afinal invertido a descida de qualidade, antes pelo contrário.
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