domingo, 9 de dezembro de 2012

ATIVAÇÃO (COLOCAÇÃO) DE DESEMPREGADOS

(À margem da ironia da inscrição na parede e da localização algo estranha do caixote do lixo)


O Jornal de Negócios da passada quinta feira (6 de Dezembro) publicou uma notícia-reportagem do jornalista António Larguesa que passou despercebida na voracidade com que a informação económica se perde no contexto atual das desventuras da economia portuguesa.
O tema nuclear da notícia é o confronto entre o potencial de colocação de desempregados evidenciado pelas empresas privadas de emprego e o dos serviços públicos de emprego tutelados pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional. Os números apresentados têm de ser interpretados com alguma cautela, mas merecem atenção e comentário. Os números oficiais de colocações realizadas pelos serviços do IEFP são de 60.135 colocações realizadas em 2011, das quais a maioria é de contratos temporários (46.154). Em contrapartida, os números avançados pela associação das empresas do setor privado de emprego (APESPE) apontam para cerca de 280.000 cedências por parte das agências de trabalho temporário correspondentes a cerca de 160.000 pessoas. Refira-se entretanto que os próprios serviços públicos de emprego respondem frequentemente a pedidos realizados pelas empresas de trabalho temporário, não sendo possível medir que percentagem das 60.135 colocações asseguradas pelos serviços públicos de emprego foi concretizada a partir da resposta a pedidos das empresas de trabalho temporário.
Não há informação fidedigna que permita testar se o valor de cedências de trabalho temporário corresponde de facto ao número assinalado pela associação do setor. Para além dessa impossibilidade, que por si só aconselha cautela na manipulação da comparação realizada, em teoria os serviços públicos de emprego deveriam protagonizar uma estratégia de ativação de desempregados mais ampla e exigente do que uma simples empresa de trabalho temporário. O processo de ativação de desemprego é um complexo processo de matching entre o que deveria ser um balanço de competências do desempregado (qualificações formais e competências acumuladas ao longo de uma trajetória de presença no mercado de trabalho) e as competências procuradas pelo potencial empregador. Simplesmente, em contextos de explosão do desemprego e de aumento significativo da dimensão estrutural desse desemprego, o que acontece é que os serviços públicos de emprego são sujeitos a uma procura massiva, alterando radicalmente a relação “desempregados/técnicos de emprego) e transformando não raras vezes a ativação num processo meramente burocrático que é a negação da complexidade de um “matching”. Acresce que, com a ofensiva em curso dirigida aos serviços da administração pública, com novos recrutamentos suspensos, redução substancial da dotação orçamental para as medidas de emprego e formação, cortes salariais atingindo as condições de vida dos técnicos de emprego, a comparação com as agências de trabalho temporário é de baixo nível e viciada.
Isto não significa que a existência de entidades privadas de colocação de desempregados não possa ser considerada uma possibilidade para melhorar as condições de ativação e colocação de desempregados. Mas fazê-lo na base de comparações desta natureza faz lembrar os rocambolescos casos de degradação forçada e voluntária de serviços públicos para criar condições para a sua privatização.
Isto também não implica que se ignore a necessidade de uma profunda revisão dos serviços públicos de emprego, adaptando as suas metodologias de ativação e colocação de desempregados ao contexto do crescimento de desemprego estrutural. Posso adiantar que o IEFP tem suspensa a contratualização de um trabalho (já decidido em sede de concurso público amplamente participado, com 22 empresas concorrentes), no qual eu próprio participaria, de avaliação da satisfação dos utentes dos centros de emprego (presenciais e internet) que conduziria a propostas e recomendações concretas de reorganização dos serviços. Suspensa essa contratualização, provavelmente num monte qualquer de autorizações do Ministério das Finanças, estamos perante mais um indicador da insensibilidade à melhoria dos serviços públicos que a governação atual tem revelado, quando essa melhoria era estritamente necessária para melhorar a eficácia e eficiência dos fundos públicos para a ativação de desempregados. E a experiência de processos similares sugere que se assiste à degradação do serviço para depois justificar a sua substituição por um serviço privado que, uns tempos mais tarde, iremos confirmar não ter afinal invertido a descida de qualidade, antes pelo contrário.

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