Já há longo tempo que
passava pelo local e nunca deu para aí mergulhar. Hoje, finalmente, num sábado solarengo
e mais descontraído e sem Seixas no horizonte do fim de semana, deu para passar
pela feira da Vandoma, numa hora já não tão matutina como isso, ou seja, sem o
mistério da penumbra do dia que amanhece, não na Lisboa que amanhece como na
canção de Caetano Veloso e Sérgio Godinho, mas sim no Porto.
A experiência vale a
pena. Não porque apeteça comprar muita coisa, comprei por 50 cêntimos o Homem Sombra de Dashell Hammett da Coleção
Vampiro que se havia perdido em alguma arrumação mais rigorosa e a minha mulher
quatro azulejos por cinco euros. Mas sobretudo vale a pena pelo contacto com
uma multidão muito especial, que se amontoa em pequenas e médias bancas contíguas,
num ambiente que mistura fugidiamente o informal e o ilegal, um clima algo
subterrâneo que se manifesta à luz do dia, hoje um dia pingando sol sobre o
Douro.
Pelo tipo de materiais
impensáveis que aí se vende, veio-me à cabeça uma expressão que descreve bem, a
meu ver, a Vandoma, com toda a sua especificidade – reciclagem social. De
facto, o mundo de artefactos que ali se vende e sobretudo o modo como cada
vendedor transporta para o “mercado” toda aquela diversidade de produtos
transportam-nos para um mundo de consumo que não é mais do que um complexo
processo de reciclagem com as suas regras próprias e protagonistas convictos
(compradores e vendedores). A Vandoma não é uma feira da ladra de Lisboa, o Rastro de Madrid ou o Portbello Road de Londres. Pareceu-me ser um complexo processo de reciclagem social dos produtos mais inesperados.
Ao fim da manhã, já a
caminhar para o almoço, um café numa esplanada da Foz mostrou-me como é possível
na mesma Cidade coexistirem mundos tão diversos. Não sei se pelos personagens
que nos tocaram na rifa na mesa ao lado, talvez tenha sido isso, fiquei com a
sensação de que, apesar de tudo e de ser um simples visitante episódico, o ambiente
da Vandoma era mais autêntico.
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