sábado, 8 de dezembro de 2012

RECICLAGEM SOCIAL




Já há longo tempo que passava pelo local e nunca deu para aí mergulhar. Hoje, finalmente, num sábado solarengo e mais descontraído e sem Seixas no horizonte do fim de semana, deu para passar pela feira da Vandoma, numa hora já não tão matutina como isso, ou seja, sem o mistério da penumbra do dia que amanhece, não na Lisboa que amanhece como na canção de Caetano Veloso e Sérgio Godinho, mas sim no Porto.
A experiência vale a pena. Não porque apeteça comprar muita coisa, comprei por 50 cêntimos o Homem Sombra de Dashell Hammett da Coleção Vampiro que se havia perdido em alguma arrumação mais rigorosa e a minha mulher quatro azulejos por cinco euros. Mas sobretudo vale a pena pelo contacto com uma multidão muito especial, que se amontoa em pequenas e médias bancas contíguas, num ambiente que mistura fugidiamente o informal e o ilegal, um clima algo subterrâneo que se manifesta à luz do dia, hoje um dia pingando sol sobre o Douro.
Pelo tipo de materiais impensáveis que aí se vende, veio-me à cabeça uma expressão que descreve bem, a meu ver, a Vandoma, com toda a sua especificidade – reciclagem social. De facto, o mundo de artefactos que ali se vende e sobretudo o modo como cada vendedor transporta para o “mercado” toda aquela diversidade de produtos transportam-nos para um mundo de consumo que não é mais do que um complexo processo de reciclagem com as suas regras próprias e protagonistas convictos (compradores e vendedores). A Vandoma não é uma feira da ladra de Lisboa, o Rastro de Madrid ou o Portbello Road de Londres. Pareceu-me ser um complexo processo de reciclagem social dos produtos mais inesperados.
Ao fim da manhã, já a caminhar para o almoço, um café numa esplanada da Foz mostrou-me como é possível na mesma Cidade coexistirem mundos tão diversos. Não sei se pelos personagens que nos tocaram na rifa na mesa ao lado, talvez tenha sido isso, fiquei com a sensação de que, apesar de tudo e de ser um simples visitante episódico, o ambiente da Vandoma era mais autêntico.

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