(Imagem de Getty no Financial Times)
Aparentemente, a conferência de Mário Draghi assentou na normalidade, manutenção da taxa de juro
de referência, assunção da estabilidade de preços abaixo dos 2% em 2013 e manutenção
no longo prazo em torno dos 2%. Mas há matéria de discussão que está para além
da normalidade.
Em primeiro lugar, o
BCE confirma que teremos em 2013 um agravamento recessivo da zona euro na sequência,
segundo Draghi, dos ajustamentos de balanço dos setores financeiro e não
financeiro. Mas o que é algo misterioso é a confiança numa recuperação na
transição de 2013 para 2014 como resultado da recuperação da procura global e
da política monetária acomodatícia do BCE responsável, ainda segundo Draghi, pela
melhoria dos índices de confiança nos mercados financeiros. Não é nada claro se
esta confiança diferida no tempo, para fins de 2013, releva mais do domínio do “wishful thinking” e menos de bases sólidas
de previsão. Draghi, em conformidade, continua a colocar os seus ovos no cesto
das operações de refinanciamento com procedimentos de taxa fixa. Não pode,
entretanto, deixar de reconhecer que continuam a existir dificuldades de transmissão
dos efeitos da política monetária para as condições de financiamento da
economia, para cuja facilitação o reforço da resiliência bancária continua a
ser considerado por Draghi como algo de crucial. Tudo isto finalizado com o blá blá do costume sobre as reformas
estruturais e a consolidação fiscal.
Mas matéria mais
interessante emergiu na fase de perguntas e respostas. Primeiro, a incomodidade
da interpelação segundo a instabilidade italiana vista pelos olhos dos
mercados, para a qual não houve comentário. Depois, a interpelação do eventual
conflito de interesses da participação de Draghi no Grupo dos 30 (G30), que terá
segundo o jornalista interpelante cofinanciamento por parte da Goldman Sachs e
participação de cinco anteriores quadros (entre os quais Draghi) nesse mesmo
grupo. A resposta de Draghi é pouco convincente, desconhecia o cofinanciamento
da Golden Sachs. Depois, o reconhecimento na resposta a um outro jornalista de
que as operações de refinanciamento assumidas pelo BCE ainda não se transmitem
fluidamente no crédito à economia, esperando Draghi que a fragmentação dos
mercados financeiros e de crédito possa ser ultrapassada. Finalmente, a
interpelação mais contundente de outro jornalista acerca da “killer medicine” praticada na Grécia. Compreensivelmente,
a réplica de Draghi andou pelo politicamente (BCE) correto.
Concluindo, no seio de
uma conferência de aparente normalidade, as sombras das incoerências e
fragilidades da abordagem em curso à crise das soberanas projetam-se no
discurso de Draghi, não só na declaração escrita, mas também nas respostas às
interpelações da conferência de imprensa.
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