sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

COMO SE FEZ ESTE PORTUGAL TRINTÃO

(João Abel Manta)

Diz-se, e é bem verdade, que de diagnósticos está o mundo cheio e que precisamos é de quem traga soluções e seja capaz de as implementar. Mas ainda sou dos que acreditam que sem um bom diagnóstico não há cura possível – compreender para transformar, como dizia o velho homem das barbas – e também que o facto de existirem muitos diagnósticos não implica necessariamente a sua qualidade.

Vem isto a propósito da recente leitura que fiz de um desses espécimes cada vez mais raros que é o diagnóstico lúcido e assertivo. Foi no excelente número 2 da Revista “XXI, Ter Opinião” da Fundação Francisco Manuel dos Santos e num artigo do já aqui referenciado José Manuel Félix Ribeiro designado “Como recuperar a liberdade perdida”.

O autor interroga-se sobre as principais escolhas que fizemos, nós Portugal, ao longo das últimas décadas e que formataram por completo a economia portuguesa, trazendo-a até ao atual condicionamento “troikista”. Elege sete, a saber:

1.       um “Estado social” assente no papel dominante do Estado na prestação de serviços de ensino, saúde e cobertura de riscos individuais, assim desvalorizando a alternativa de um co-financiamento público em função do rendimento das famílias;

2.       uma gestão do processo de privatizações em moldes que contribuíram para a aceleração do endividamento externo e objetivamente impediram a consolidação de pólos empresariais privados internacionalmente sólidos;

3.       um sistema financeiro orientado para a quase total prevalência de uma fragilizada intermediação bancária, assim fortemente limitado em termos das oportunidades associadas a um desenvolvimento de investidores institucionais e do mercado de capitais;

4.       um modelo de internacionalização mais centrado na projeção internacional das grandes empresas dos sectores infraestruturais do que na procura das parcerias internacionais mais adequadas;

5.       um modelo de utilização dos fundos estruturais comunitários mais preocupado com as dinâmicas internas (redução de distâncias e PMEs) do que com a competitividade internacional (conectividade e investimento estrangeiro);

6.       um modelo de administração do território que privilegiou um nível municipal muito fragmentado e perversamente concorrencial em termos de mecanismos de mercado e de retorno económico;

7.       uma aceitação precoce das exigências da União Económica e Monetária e, consequentemente, uma adesão prematura ao Euro.

Cada um destes sete pontos, parecendo largamente certeiro, é suscetível de levantar um mar de questões e de abrir um enorme espaço ao debate. O que apenas decorre de o mundo não ser a preto e branco. Mas isto vai tão pobre e cinzento que o surgimento de alguma polémica seria uma remuneração muito gratificante para este post…

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