A pretexto da intervenção na
iniciativa dos Verdes e da visita ao neto Francisco, alguns dias de mergulho de
sol nesta Lisboa de luz avassaladora, reunindo ideias soltas enquanto que, nos
minutos disponíveis, preparo o comentário à apresentação do livro póstumo e inédito
de Celso Furtado Ensaios sobre Cultura a cargo de sua mulher Rosa Aguiar
Furtado, em Serralves, dia 27, às 18.30.
Em primeiro lugar, uma nota
sobre a minha experiência de passagem pela iniciativa dos Verdes.
Não sei se a mensagem terá
sido compreendida, num debate muito marcado pela defesa do federalismo, a toda a
brida, como resposta para a crise global e da própria construção europeia. Algumas
linhas de consenso penso que foram formadas: o risco da destruição da Grécia
poder destruir todo o projeto e implodir o sistema europeu, agitando velhos demónios;
a necessidade de inverter toda a orientação de política macroeconómica
europeia; a vantagem dos países da Europa do Sul em defender-se das pressões da
globalização no seio da União Europeia; a necessidade de controlar a
financialização da economia; eleição democrática do Presidente do Conselho
Europeu.
Mas pareceu-me existirem matérias
longe de constituírem consenso. Por exemplo, a ideia radical de Cohen Bendit de
destruição do Estado-nação como condição necessária de viabilização do
federalismo não sei se será potencialmente aglutinadora para um espaço de eleições
europeias. Por outro lado, tenho dúvidas de que a situação estrutural das economias
do sul tenha a melhor interpretação e de que não haja algum paternalismo na
compreensão da nossa situação. Rui Tavares tem um longo trabalho à sua frente
se pretender constituir alguma plataforma eleitoral em Portugal para as
europeias. Mas encheu o espaço do auditório do Mercado da Ribeira.
Lisboa está “ocupada” com
30.000 elementos do Rotary Internacional no seu congresso anual. É visível esta
massa “invasora” em tudo que é espaço público e o turismo afirma-se cada vez
mais como um atividade de fortíssima receita líquida de exportação. E Lisboa
perfila-se como a grande plataforma giratória desta realidade.
Sábado de manhã corrigi uma
das minhas grandes insuficiências de visitante cultural da Cidade entrando finalmente
na lindíssima Igreja de S. Roque, para ver o espantoso Altar de S. João com os
fabulosos micromosaicos, memória de outros tempos em que havia excedente (vindo
de fora esclareça-se). A preparação de uma exposição e de um programa de
televisão produzia um ambiente incompatível com o recado da fruição de tanto
apuro e beleza. E eis que senão quando, em pleno ruído de rebarbadeiras e de
Black & Decker’s aparafusando painéis, uma voz lindíssima de soprano ecoava
do alto do coro, em ensaio para um concerto próximo. Fiquei com a impressão de
que a soprano e o coro acabaram por vencer os berbequins, num momento de pura
evasão. Os visitantes hesitavam entre continuar a visita algo agitada pelo
ambiente caótico das obras e fixar o olhar e o ouvido para o alto. Visita
incompleta. S. Roque merece uma outra visita em ambiente mais recatado.
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