terça-feira, 4 de junho de 2013

CARLOS COSTA NA ASSEMBLEIA (COFAP)

(com desculpas pela terminologia brasileira)


A audição anual do Governador do Banco de Portugal na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP) da Assembleia da República agitou as hostes, sobretudo as da oposição, suscitando alguns remoques irónicos (João Galamba) ou de sugestão de que o governador visaria outros voos (Honório Novo e Bloco). Uma breve pesquisa pelos ecos da audição na comunicação social situa a intervenção do governador como uma espécie de respaldo da atuação de Vítor Gaspar. Como não tive oportunidade de ouvir com pormenor a totalidade da audição e estranhando a “narrativa” que circulou pelos registos jornalísticos atirei-me à apresentação que ao fim da tarde já constava da página do Banco de Portugal.
A apresentação ainda que não esteja formalmente dividida em três partes, organiza-se em três grandes domínios: a intervenção do Banco de Portugal (enquadramento, contas e desafios); uma revisitação dos fatores que conduziram a economia portuguesa à situação de crise; e o programa de assistência económica e financeira.
Os dois primeiros temas da audição não me parecem fator de controvérsia. A atividade do Banco parece bem conduzida e os aspetos de supervisão e de gestão macroprudencial inspiram confiança. A explicação dos fatores que conduziram à crise não é a dominante em Portugal, mas tendo a subscrevê-la, sobretudo com a ênfase na perversa afetação de recursos que a política económica anterior a 2008 tendeu a favorecer e, por consequência, implicando desalavancagens pesadas, públicas e privadas. É na terceira dimensão da audição que está a matéria de controvérsia.
A intervenção de Carlos Costa privilegia claramente a dimensão dos ajustamentos orçamentais e de desequilíbrio externo e passa ao de leve pela questão dos custos sociais, não apenas colaterais. Embora da apresentação não ressalte a metáfora utilizada, CC na audição usa a metáfora do velejar contra o vento (a evolução adversa da situação económica internacional) para explicar a dificuldade de cumprimento das metas, mesmo que o velejador seja de grande qualidade (Gaspar agradece). Ora, esta metáfora não me convence. O problema não me parece estar apenas no vento que dificulta a navegação. O problema está também na técnica de navegação, ou seja, designadamente do erro praticado nas combinações de dose de disciplina e de almofadas sociais necessárias. Para além disso, o vento era esperado, sobretudo predominando na União Europeia uma coordenação de política macroeconómica que acentua o tom recessivo das intervenções nos países (como Portugal) sem margem de manobra para expansão fiscal. E sobre estas questões CC passa ao de leve, referindo é um facto o problema da má coordenação da política económica europeia como um agravamento dos ventos desfavoráveis. Mas conceber um ajustamento desta envergadura sem integrar o problema europeu, claramente potenciador dos efeitos recessivos do ajustamento, será apanágio de um bom velejador? Mas será que o comportamento da receita depende apenas do contexto internacional?
Outra afirmação que não me convenceu foi o da crítica aos que criticam o não atingir das metas, sugerindo que essa critica se reconduz no fundo à invocação de mais austeridade. A interpretação é redutora. Há quem critique essa má pontaria com o argumento da dose errada de austeridade. O que não é a mesma coisa.
A intervenção de CC está virada para o princípio da garantia de acesso ao financiamento externo no período pós Troika e daí a sua referência, que vale a pena estudar, a um programa cautelar. Compreende-se o foco. A metáfora da vela contra o vento é uma forma de respaldo de Gaspar e parece-me algo inconsequente, mesmo que para consumo internacional e para demover as autoridades europeias.
O último slide sobre os desafios para a economia portuguesa sabe a pouco. A economia portuguesa já não carece apenas de enunciado de desafios. Precisa de algo mais. Talvez noutro contexto, CC entre nessa questão decisiva.

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