domingo, 9 de junho de 2013

PRECIOSIDADES (15)



Cada entrevista de Anabela Mota Ribeiro é um documento ímpar de uma nova perspetiva sobre nós, país a precisar de um rumo, pela voz desalinhada e contra a corrente dos que estão para além do folclore da comunicação e do marketing para estrangeiro ver e que são resilientes por ser autênticos, simplesmente autênticos.
A entrevista de hoje com o escultor Alberto Carneiro reencontra-nos com as raízes da terra e da natureza.
Alguns pequenos excertos.
AMR: “Se me apresentasse a cerejeira, como se apresenta uma pessoa, diria o quê? Sólida, sonhadora, altiva?”
AC: “As árvores têm uma personalidade. Tenho uma relação visceral com elas. Diria que era uma árvore elegante. Mais feminina do que masculina. As formas eram redondas, suaves. Apelava ao tacto. Casca rugosa e macia, pouco acidentada. Os acidentes provocam sensações”.
AMR: Essa essência que procura é aquilo a que o Pina, no poema, chama “o primeiro, o incriado?”
AC: “Exacto. O incriado está sempre lá. Como princípio, como qualquer coisa que se vai revelar. Em rigor, nunca se revela na totalidade. O artista nunca acaba a sua obra. Quando nos debruçamos sobre a obra de um artista, vemos que do primeiro ao último momento ele andou à volta, à procura, à procura. E encontrou sempre alguma coisa. Brancusi, Giacometti, Miguel Ângelo, Berrnini: vemos a obra e percebemos que é uma busca. Uma busca que não termina. Infelizmente a pessoa foi-se embora. Outro vai retomá-la.
AMR: Para voltar ao poema de Manuel António Pina; “A mão é uma árvore crescendo para dentro”. Em direção à raiz, ao que está sedimentado?”
AC: “Sim. Só justificamos a nossa compreensão da vida através dessa memória, desse enraizamento dessa coisa que anda dentro. Que anda e que continua a crescer dentro. Tudo se estabelece por relação. Nada vive sozinho. Uma coisa é grande porque temos uma pequena. É larga porque temos uma estreita. O fundamental, todos sabem, é a diferença. Não é a semelhança.”
Alguém editará algum dia os ecos e memórias da sueca a quatro: Alberto Carneiro, Manuel António Pina, Arnaldo Saraiva, Joaquim Vieira?

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