Mergulhei nestes dias na
segunda leitura do livro Ensaios sobre
cultura e o Ministério da Cultura de Celso Furtado, com edição recente do
Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento e
organização de sua mulher Rosa Freire d’Aguiar Furtado, que será apresentado em
Serralves, na próxima quinta-feira, às 18.30, por esta última e comentário meu.
A apresentação surge integrada no Imaterial 2, série de conferências que Artur
Castro Neves tem organizado.
Partilharei convosco nos próximos
dias alguns excertos dessa obra, em torno dos quais vou construir o meu comentário.
A atualidade dos textos de
Celso Furtado é profunda. Comecemos por um excerto datado de 1984, inserido
numa conferência de Celso Furtado no I Encontro de Política Cultural, em Belo
Horizonte:
“(…)
A crise que agora aflige o nosso povo não
decorre apenas de amplo processo de reajustamento que se opera na economia
mundial. Em grande medida, ela é a manifestação antecipada de um impasse que se
apresentaria em nossa sociedade, que pretende reproduzir a culturav material do
capitalismo mais avançado privando a grande maioria da população de bens e
serviços essenciais. Como não é possível evitar que se difundam, de uma ou
outra forma, certos padrões de comportamento adotados pelas minorias de altas
rendas, surge uma contrafação de sociedade de massas em que se acomodam formas
sofisticadas de consumo supérfluo com carências essenciais.
A superação desse impasse, somente
a criatividade política impulsada pela vontade coletiva poderá produzi-la. Ora,
essa vontade coletiva terá de surgir de um reencontro das lideranças políticas
com os valores permanentes de nossa cultura. É aqui que se insere a questão
inicial: que somos? Uma reflexão sobre nossa própria identidade terá que ser o
ponto de partida do processo de reconstrução que temos pela frente, se
desejamos que o desenvolvimento futuro se alimente da criatividade do nosso
povo e contribua para a satisfação dos anseios mais legítimos deste. Devemos
pensar em desenvolvimento a partir de uma visualização dos fins substantivos
que desejamos alcançar e não da lógica dos meios que nos é imposta do exterior.
A superação do impasse estrutural que está no fundo de nossa crise somente será
lograda se o desenvolvimento futuro conduzir a uma crescente homogeneização de
nossa sociedade e abrir espaço à realização das potencialidades de nossa
cultura.”
Isto é escrito no contexto
de uma sociedade de industrialização dependente e tardia. Mas o que é
impressionante é que nos interpela a nós Portugueses e direi também ao Brasil
de hoje. Não é espantoso que quase 30 anos passados este texto nos interpele?
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