Não conheci pessoalmente João Pinto e Castro (JPC), agora subitamente falecido aos 62 anos. Mas lia-o com bastante frequência no “Jornal de Negócios” e apreciava, sobretudo, a sua independência de pensamento e a desempoeirada lucidez das suas análises críticas do provinciano mainstream económico que nos sufoca.
Uma das mais recentes crónicas de JPC a que acedi – “Queimar dinheiro na praça pública” – reportava 12,2 mil milhões de euros que Gaspar e o seu Governo fizeram desaparecer. Aqui quero deixar o respetivo registo e, ao fazê-lo, render uma derradeira homenagem ao seu autor:
“Em 2011 e 2012, o governo português programou retirar da economia, sob a forma de aumentos de impostos ou cortes da despesa, 18 mil milhões de euros; todavia, a redução efetiva do défice ficou abaixo de 5,8 mil milhões. Pelo caminho, desapareceram 12,2 mil milhões.
Tenho, por conseguinte, o orgulho de poder anunciar-vos que o nosso pequeno, mas engenhoso país ultrapassou estratosfericamente a façanha dos dois ingleses, queimando nos dois últimos anos uma quantia de dinheiro no mínimo 12 mil vezes superior.
A questão que convém esclarecer é esta: para onde foram esses 12,2 mil milhões?
Por força da política de austeridade aplicada, reduzindo-se a atividade económica, ficou a cobrança de impostos muito aquém do esperado; por outro lado, a quebra da atividade económica implicou mais despesa com subsídios de desemprego. A contrapartida real do desvario austeritário foi, pois, a destruição de riqueza nacional num valor próximo dos 6% do PIB.
Como, apesar da colossal dimensão do sinistro, a notícia passou relativamente despercebida dos portugueses, talvez seja indicado recordar mais devagarinho o que sucedeu: a carga fiscal atingiu níveis intoleráveis; reduziu-se a oferta dos serviços públicos; degradou-se drasticamente a sua qualidade; trouxe-se o desemprego para níveis record; cortou-se drasticamente o rendimento disponível das famílias; milhares e milhares de empresas fecharam as suas portas – e, apesar da escala da austeridade aplicada, foi mínimo o impacto de toda essa loucura sobre o défice público.
Por outras palavras, torrou-se dinheiro em Portugal numa escala e a uma velocidade nunca vistas ou imaginadas.
Pessoas preocupadas com a má despesa pública fulminam a rotunda supérflua, o pavilhão gimnodesportivo subutilizado, a estrada onde passam poucos carros. Mas em todos esses casos, ficou apesar de tudo alguma coisa que podemos ver e, se necessário, utilizar. Ao passo que a obra de Gaspar consiste apenas e só em queimar dinheiro numa pira funerária, provocando direta e ativamente a degradação das condições de vida de milhões de pessoas. Destruição a troco de nada, portanto.
Por outras palavras, a delapidação de recursos eventualmente operada por anteriores governos é discutível, parcial e relativa, ao passo que a promovida por este é inquestionável, total e absoluta.
12,2 mil milhões de euros dariam para muitas aplicações simultâneas ou alternativas para todos os gostos e critérios: um novo aeroporto de Lisboa, uma mão cheia de hospitais e centros de saúde, completa renovação do parque escolar, centros de investigação, formação profissional, recapitalização da segurança social – enfim, uma infinidade de bens coletivos ao serviço do bem-estar das populações e do investimento produtivo.
Todavia, já que, nos tempos que correm, a opinião dominante prefere a qualquer outra eventualidade a pura e simples destruição de recursos, seria de esperar que ao menos ela fosse conduzida com um mínimo de método e grandeza. Desde logo, porquê levá-la a cabo discretamente, longe das vistas do país e do mundo?”
Ficou mais pobre o já tão debilitado panorama do debate público nacional…
Uma das mais recentes crónicas de JPC a que acedi – “Queimar dinheiro na praça pública” – reportava 12,2 mil milhões de euros que Gaspar e o seu Governo fizeram desaparecer. Aqui quero deixar o respetivo registo e, ao fazê-lo, render uma derradeira homenagem ao seu autor:
“Em 2011 e 2012, o governo português programou retirar da economia, sob a forma de aumentos de impostos ou cortes da despesa, 18 mil milhões de euros; todavia, a redução efetiva do défice ficou abaixo de 5,8 mil milhões. Pelo caminho, desapareceram 12,2 mil milhões.
Tenho, por conseguinte, o orgulho de poder anunciar-vos que o nosso pequeno, mas engenhoso país ultrapassou estratosfericamente a façanha dos dois ingleses, queimando nos dois últimos anos uma quantia de dinheiro no mínimo 12 mil vezes superior.
A questão que convém esclarecer é esta: para onde foram esses 12,2 mil milhões?
Por força da política de austeridade aplicada, reduzindo-se a atividade económica, ficou a cobrança de impostos muito aquém do esperado; por outro lado, a quebra da atividade económica implicou mais despesa com subsídios de desemprego. A contrapartida real do desvario austeritário foi, pois, a destruição de riqueza nacional num valor próximo dos 6% do PIB.
Como, apesar da colossal dimensão do sinistro, a notícia passou relativamente despercebida dos portugueses, talvez seja indicado recordar mais devagarinho o que sucedeu: a carga fiscal atingiu níveis intoleráveis; reduziu-se a oferta dos serviços públicos; degradou-se drasticamente a sua qualidade; trouxe-se o desemprego para níveis record; cortou-se drasticamente o rendimento disponível das famílias; milhares e milhares de empresas fecharam as suas portas – e, apesar da escala da austeridade aplicada, foi mínimo o impacto de toda essa loucura sobre o défice público.
Por outras palavras, torrou-se dinheiro em Portugal numa escala e a uma velocidade nunca vistas ou imaginadas.
Pessoas preocupadas com a má despesa pública fulminam a rotunda supérflua, o pavilhão gimnodesportivo subutilizado, a estrada onde passam poucos carros. Mas em todos esses casos, ficou apesar de tudo alguma coisa que podemos ver e, se necessário, utilizar. Ao passo que a obra de Gaspar consiste apenas e só em queimar dinheiro numa pira funerária, provocando direta e ativamente a degradação das condições de vida de milhões de pessoas. Destruição a troco de nada, portanto.
Por outras palavras, a delapidação de recursos eventualmente operada por anteriores governos é discutível, parcial e relativa, ao passo que a promovida por este é inquestionável, total e absoluta.
12,2 mil milhões de euros dariam para muitas aplicações simultâneas ou alternativas para todos os gostos e critérios: um novo aeroporto de Lisboa, uma mão cheia de hospitais e centros de saúde, completa renovação do parque escolar, centros de investigação, formação profissional, recapitalização da segurança social – enfim, uma infinidade de bens coletivos ao serviço do bem-estar das populações e do investimento produtivo.
Todavia, já que, nos tempos que correm, a opinião dominante prefere a qualquer outra eventualidade a pura e simples destruição de recursos, seria de esperar que ao menos ela fosse conduzida com um mínimo de método e grandeza. Desde logo, porquê levá-la a cabo discretamente, longe das vistas do país e do mundo?”
Ficou mais pobre o já tão debilitado panorama do debate público nacional…
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