(Na reta final
para o referendo do LEAVE ou REMAIN uma infografia do Economist mostra com a força da cartografia que
talvez andássemos distraídos sobre a amplitude dos sucessivos alargamentos da
União)
Dizia hoje o Professor
João Ferreira do Amaral, numa curta entrevista à ANTENA 1, que, em seu
entender, o risco mais relevante de um BREXIT com uma eventual vitória do LEAVE
estaria na perda para o projeto europeu do país com mais tenacidade e melhores
condições para contrariar o centralismo europeu que a hegemonia alemã
introduziu na União. Curiosamente, hoje, 21 de junho de 2016, o tribunal
constitucional alemão reuniu em Karlsruhe para emitir um veredicto (positivo) sobre
a heterodoxia praticada pelo BCE sob a presidência de Mario Draghi no combate
aos riscos deflacionários na União. Sinceramente, não sei o que será mais
importante, se a proximidade ao referendo de 23, se a decisão do tribunal
alemão. Ao mesmo tempo, JFA desvalorizava os argumentos catastrofistas
invocados pela campanha do REMAIN, com o governo conservador à cabeça, com o
argumento que muito provavelmente os princípios do livre comércio com o Reino
Unido poderão persistir mesmo no caso de um eventual BREXIT. Dou-lhe razão e as
suas curtas palavras têm a vantagem de nos relembrar como andámos distraídos na
não monitorização das complexas relações entre o aprofundamento da União como
projeto económico e a sua gestão política.
O Economist propõe-nos uma
infografia através da qual se mapifica toda a evolução dos sucessivos
alargamentos da União desde 1952 até 2016. A infografia é consultável aqui (ver
link) pelo que me limito a reproduzir três datas, o início, a data da nossa
adesão com a Espanha e hoje. Visualizada assim, a magnitude dos sucessivos
alargamentos é contundente e compreende-se como muito dificilmente um
alargamento desta envergadura poderia ter gerado uma mais saudável relação
entre o aprofundamento económico e político da União.
O aprofundamento da
integração económica da União, balizada sobretudo pelo projeto do Mercado Único
Europeu, não pode ser desligado dos rumos da globalização. Nesta perspetiva, a
integração económica da União é uma espécie de globalização dentro da
globalização. Ora, ao contrário do modo como foi “vendida”, a globalização está
longe de ser um “céu para todos”, aplanador das diferenças e, na sua última
fase, veja-se o célebre contributo do jornalista americano Thomas Friedman, uma
globalização das pessoas com os mercados globais a proporcionarem a todos os indivíduos,
onde quer que estejam, a maximização das suas potencialidades. Não. Como tenho
vindo a insistir, a globalização não é um processo win-win. Há ganhadores e perdedores. Está por
aí oculto mais ou menos este raciocínio. Vamos permitir que os ganhos de
ascensão das classes médias nas economias emergentes, beneficiadas com o
aprofundamento da globalização, se transformem em poderosos instrumentos de
reivindicação da democracia e em agentes da transformação política desses
países. Ora, esta transformação das classes médias ganhadoras em forças de
transformação política tem-se revelado mais lenta do que o esperado por aquele
argumento. Ou porque para algumas dessas economias não são líquidos os seus
ganhos (caso do Brasil), ou porque a sua capacidade de influência política está
mais interrogada do que o suposto (caso da China e de outras economias
asiáticas). E, pelo contrário, os perdedores da globalização, nos quais se
situam dominantemente as classes médias e as classes trabalhadores das
economias mais avançadas, sem resposta para os seus problemas, começam a
manifestar-se politicamente, não através dos mecanismos mais tradicionais de
representação política, mas a alimentar os diferentes modelos e manifestações
de populismo político.
É manifesto que esta
dimensão da regulação dos efeitos da globalização económica e financeira não
foram sendo acautelados com a transformação do edifício europeu para um número
tão elevado de inquilinos. Por outro lado, à medida dos sucessivos alargamentos,
as desigualdades de desenvolvimento intensificaram-se. Se todos os ideólogos do
alargamento tivessem lido os pioneiros da economia do desenvolvimento, teriam
compreendido que os mecanismos do comércio livre não produzem benefícios
independentemente do estádio e dos problemas estruturais de desenvolvimento dos
países envolvidos.
E voltamos ao trilema de
RODRIK. Haverá condições para tecer de novo os rumos do alargamento,
designadamente os mecanismos de regulação política necessários atendendo aos
desiguais efeitos da integração económica aprofundada? Será por via de uma
maior participação dos parlamentos nacionais que isso se consegue, como os
ingleses têm reivindicado e que é também visível em algumas intervenções de
José Pacheco Pereira? Ou será por uma significativa revisão das condições da
integração política, com mais democracia nas instituições europeias.
Uma vitória do REMAIN
talvez reforce a primeira. Uma vitória do LEAVE pode precipitar a desintegração,
mais pelo impacto político do que pelo pretenso catastrofismo dos efeitos
económicos.
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