(Que me desculpem
os patriotas e os oficialistas mas só a garra de Ana Moura com o seu Dia de Folga
me chega à mente para comemorar
à minha maneira o 10 de junho)
“Cada dia … é um bico-de-obra … uma carga de trabalhos” é
assim que começa a canção de Ana Moura (ver link aqui) e não sei por que razão especial é esse
refrão que marca para mim o 10 de junho. O Presidente Marcelo e o ministro dos
Negócios Estrangeiros, o amigo Augusto Santos Silva convergiram na ideia de que
se as elites portuguesas estivessem ao nível do povo que temos, cá e na diáspora,
forçada ou livremente assumida, o país estaria certamente melhor. Estou inclinado
a dar-lhes razão à medida que me vou apercebendo da carga de trabalhos e dos
bicos-de-obra que os portugueses indiferenciados enfrentam todos os dias para
sobreviver a uma vida que continua interrogada.
E por falar em elites ontem foi confrangedor ver os enrascados Jorge Coelho
e António Lobo Xavier aguentar a investida de Pacheco Pereira sobre a recente
vocação empresarial de Paulo Portas, investido na sua qualidade de senhor Mota
Engil para a América Latina, transportando direta e imediatamente para aquele
grupo empresarial o conhecimento que o exercício da função de ministro dos Negócios
Estrangeiros e da diplomacia económica lhe proporcionou. Na classe política
portuguesa começam a escassear as vozes que podem falar com a autoridade moral
de Pacheco Pereira e isso é um sinal dos tempos. É óbvio que não se pretende
que os membros da classe política se transformem em monges de contemplação após
o abandono de funções. Mas seria bom que um outro padrão ético prevalecesse e
que a sociedade política gerasse um comportamento tácito acima de qualquer
suspeita e transparente. Quando o pagar as contas ao fim do mês se sobrepõe a
qualquer padrão de normalidade ética é o cabo dos trabalhos.
Marcelo bem puxa pelo que de melhor de nós se vai afirmando cá dentro e lá
fora. Mas as interrogações que continuam a pairar sobre o desempenho da
economia portuguesa arrefecem o ânimo do mais entusiasmado. O diferencial de
crescimento que apresentamos face a uma anémica União Europeia é preocupante. A
confirmação pelo Banco de Portugal (Boletim Económico e junho com previsões
para o período 2016-2018) que a mais recente queda das exportações, mais
pronunciada nos mercados extracomunitários, será em 2017 e 2018 seguida de
alguma recuperação não essencialmente determinada por melhoria de quotas de mercado
sugere que a verdadeira mudança estrutural das exportações portuguesas estará
ainda por fazer. Não é nada confortável concluir que o encerramento temporário
de uma refinaria e o quase fechamento do mercado angolano têm o peso que vai observar-se
em 2016.
A recuperação do investimento, praticamente estagnado em 2016, é antecipada
pelo Banco de Portugal em função de dissipação de expectativas de incerteza e de
renovação de equipamentos. Seria bom discutir que condições de risco o Banco de
Portugal enfrenta nesta previsão, pois, apesar de se tratar de crescimentos
moderados em torno dos 5%, representa mesmo assim uma inversão da estagnação
que tem vindo a observar-se. Não sei até que ponto a previsão do BP integra ou
não a componente do investimento assegurada via Fundos Estruturais. Considerando
que a projeção das exportações dependerá mais do estado dos nossos mercados de
destino do que do nosso esforço de aumento de quota, o comportamento do
investimento será crítico. O governo não pode ficar à margem dessa variável,
faça o que fizer e por mais recatado que o ministro da Economia se reclame.
P.S. Um bravo à Elisa Ferreira pela chama de empenho e competência que deixa no Parlamento Europeu, uma chama de elite que está à altura do povo que enfrenta dia a dia o cabo dos trabalhos.
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