(Quis o destino
que a confluência do referendo britânico e das eleições plebiscitárias em
Espanha num espaço de três dias agitasse as coisas, mas o mais dramático é que cada vez mais se
enraíza em nós a ideia de que as atuais lideranças políticas não estão, para
nossa desgraça, à altura das circunstâncias)
A combinação
da ambição desmedida dos meninos conservadores provenientes da upper class e de Eaton com o mais
profundo desencanto de largas franjas da working
class britânica, acelerada pelo isolacionismo de sempre da Little England,
revelou-se explosiva. A desorientação entre as hostes conservadoras que votaram
por esta combinação explosiva é perfeitamente patética. Mais parecem
adolescentes à solta que fizeram estragos e hesitam em recorrer aos papás e às
mamãs para resolver o problema. Não é visível qualquer perspetiva coerente de
implementação de uma estratégia de saída. Do lado trabalhista, a liderança do
sisudo Corbyn desfaz-se como se de um castelo de cartas instável se tratasse,
pagando o preço de uma campanha merdosa e não convincente a favor do REMAIN.
Mas do lado europeu a sinfonieta desafinada ainda vai no adro. Encontros
parcelares por todos os lados e feitios, acelerar as negociações para uns,
retardar para outros (para recuperar do choque ou simplesmente para que os
interesses económicos organizados se posicionem?). Uma desenfreada cacofonia
instala-se. Quanto mais fraca é a liderança de rumo mais vozes se esganiçam e
adivinha-se o pior em termos de adicionar às incertezas deflacionárias e da
estagnação secular esta outra incerteza em que o cálculo económico vai parar
para ver qual vai ser o efeito maior. Não desdenharia que os americanos se
cansassem de tanta irresponsabilidade e que viessem por aí para puxar as
orelhas e colocar nos eixos toda esta desenfreada irresponsabilidade, isto se
Trump não incendiar a questão. Deus nos valha se isso acontecesse.
Com esta
confluência do BREXIT e das eleições espanholas, há quem, embora sem evidência
fundamentada, afirme que as eleições espanholas trouxeram a primeira derrota do
populismo após o referendo britânico. Se se confirmar esta influência nas
eleições espanholas, Rajoy e o PSOE, à sua maneira e por razões diversas, bem
podem agradecer à irresponsabilidade da combinação explosiva britânica. Rajoy,
com aquele carisma de arrebatar multidões que o caracteriza, ganha as eleições,
ganhando votos aos seus principais adversários, dando cabo entre coisas da
esperança de modernidade que o CIUDADANOS representava, perdendo esta força
política pau e bola, ou seja, desce na Catalunha da sua origem e é cada vez
menos alternativa ao PP. Pedro Sánchez sustém o eventual sorpasso do PODEMOS,
mas não trava a descida histórica do partido, a precisar de uma cura prolongada,
de oposição, claro. A situação do PSOE é pungente. Susana Diáz, grande
adversária de Sánchez, fica na história perdendo a Andalúcia e isso retira-lhe
praticamente margem de manobra para protagonizar uma candidatura alternativa à
liderança do partido. Como já aqui referi, há quem fale na experiência de Patxi
López como alternativa, mas por agora é pura nebulosidade.
Por agora
ficamos com os inúmeros juízos interpretativos sobre o BREXIT, cuja proliferação
em catadupa domina claramente a blogosfera económica e política dos últimos
dias.
Alguns
exemplos, todos com publicação no Project Syndicate:
- George Soros (link) traz-nos a perspetiva do globalizador financeiro, que aproveita a embalagem para exigir uma reforça aprofundada da zona euro, com união bancária até ao fim, progressos limitados na união fiscal e mais accountability democrática. Ele lá sabe as linhas com que faz os seus negócios;
- A voz autorizada de Chris Patten (link) é talvez o mais citado, sobretudo pela invocação do aforismo de Churchill: “o problema de cometer suicídio político é que se vive para o lamentar”. Cameron provou-o com sabor amargo:
- Kenneth Rogofff (link) vem surpreendente mas fundamentadamente preocupar-se com a debilidade de representatividade democrática de referendos como o do BREXIT, sobretudo atendendo à dimensão dos danos que pode causar;
- Mark Leonard (link) é mais radical quando compara o jogo dos referendos a uma roleta russa política, invocando a subida da vetocracia e, imaginem, acabando com a metáfora da jangada (península) que se desprende;
- Harald James (link), um dos meus historiadores preferidos da globalização, refere que o BREXIT foi também uma revolta (bem sucedida?) contra o mundo dos experts económicos, que se fartaram de alertar, por vezes demagogicamente, para os custos económicos do LEAVE, para além de dar conta da onda progressiva que gerou o BREXIT.
E não ficaremos
por aqui.
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