(Tal como previa
a qualificação da “Nossa” foi ela própria bipolar, com tremideira, raça e
classe, jogando sempre na
margem do risco e até com a Islândia a jogar por nós)
Estava escrito nas
tábuas. A qualificação a dezasseis (uma bênção) haveria de ser arrebatada e nos
limites. Sem uma vitória, mas com um empate final que vale por uma vitória,
tamanha foi a margem de risco que pisámos durante largos minutos do jogo,
acabando o período de descontos no pico do aleatório, conservando uma
qualificação que não sabíamos se seria em segundo em terceiro. As coisas
parecem viradas do avesso, em princípio um segundo é melhor do que um terceiro
mas não, neste caso o segundo lançar-nos-ia na parte mais adversa do quadro e
valeria a energia enorme dos islandeses para nos colocar perante uma Croácia
(não será um presente envenenado?).
E o jogo continuou a ser
uma boa metáfora do que somos e do que temos sido. Capacidade de reação à
adversidade quanto baste. Recuperar três desvantagens não é para qualquer um,
não é de gente instalada, antes pelo contrário, é de gente habituada a porfiar
em contextos difíceis. Mas simultaneamente uma tremideira trágica, abrindo a
defesa por todos os lados, perante uns húngaros atónitos de tanta oportunidade
aberta. Dou comigo a pensar e a fazer comparações contra outras seleções, por
exemplo as duas Irlandas, do Norte e Repúblca da Irlanda. Bem menos dotadas de
recursos técnicos, a energia que deixam em campo é um espanto, mas não é
bipolar como a nossa, não há ali tremideiras.
E também Fernando Santos
permaneceu igual a si próprio, engenhoso, diligente, inclusivo, mas com um
tempo de reação lento, lento, muito lento. Foi este empate-vitória
paradoxalmente o clique que o grupo precisava para entrar numa produção mais
estabilizada e regular? O jogo com a Croácia dilo-á. O adónis Ronaldo lá
cumpriu o seu papel, criou o clímax do adormecimento e regressou imperial com
duas batatas daquelas que estão reservadas aos eleitos da natureza. João Mário
parece ter regressado e isso é uma boa notícia. Eliseu mostrou que o SLB tem de
se preocupar com a ala esquerda da sua defesa. Como sempre, lentamente, lá
vamos ajustando as nossas expectativas ao que realmente valemos, à nossa
pequena dimensão, deixando a sobre-representação do Império aos analistas mais
fantasiosos. Este ajustamento é sempre doloroso mas é a melhor forma de
controlar os danos da deceção. E dará tempo e concentração para pensar
decentemente nos cinco mil milhões que pelo que dizem é preciso meter na Caixa.
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